Fala!
«Fala a sério e fá-la no gozo
fá-la p’la calada e fala claro
fala deveras saboroso
fala barato e fala caro.
Fala ao ouvido fala ao coração
falinhas mansas ou palavrão.
Fala à miúda mas fá-la bem
fala ao teu pai mas ouve a tua mãe.
Fala franciú fala béu-béu.
Fala fininho e fala grosso
desentulha a garganta levanta o pescoço.
Fala como se falar fosse andar
fala com elegância muita e devagar».
De porta em porta
« - Quem? O infinito?
Diz-lhe que entre.
Faz bem ao infinito
estar entre gente.
- Uma esmola? Coxeia?
Ao que ele chegou!
Podes dar-lhe a bengala
que era do avô.
- Dinheiro? Isso não!
Já sei, pobrezinho,
que em vez de pão
ia comprar vinho…
- Teima? Que topete!
Quem se julga ele
se um tigre acabou
nesta sala em tapete?
- Para ir ver a mãe?
Essa é muito forte!
Ele não tem mãe
e não é do Norte…
- Vítima de quê?
O dito está dito.
Se não tinha estofo
quem o mandou ser
infinito?»
Poemas de Alexandre O’Neill,
in ‘Poesias Completas, 1951 / 1986’
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