Conceito de etnia macaense
«(…) De tudo o que foi referido, fica-nos a ideia de que o macaense é
um mestiço português euro-asiático, cuja língua materna é o português
caracterizado por uma pronúncia regional. Sendo de salientar, que as gerações
mais antigas tinham também um modo de falar próprio, o patuá, que por razões
várias, caiu em desuso nas primeiras décadas deste século. Para além do
português, o macaense aprende quase sempre desde tenra idade o cantonense, o
que faz dele um bilingue, dominando também muitas vezes o inglês. O macaense é
católico, no meio de milhares de budistas que o cercam e identifica-se com a
cultura portuguesa, não lhe sendo estranha no entanto a cultura chinesa, já que
foi criado também em contacto com ela. Esta situação, traduziu -a Cecília Jorge
num poema, de que transcrevemos uma passagem e que retrata bem um conceito
sentido, (já que a autora é macaense), nessa ambivalência de uma identidade
étnica, que se foi formando numa encruzilhada de povos e culturas, com acesso a
todos mas sem pertencer a nenhum, senão o ser macaense.
Breve história de Macau
Macau é um pequeno território com uma longitude Este entre 113.º 34' 47"
e 113.º 35' 20", e uma latitude Norte entre 22.º 06' 40" e 22.º 12'
01" situado na costa Sul da China, na margem direita da foz do delta formado
pela confluência de dois rios: o rio
do Oeste (Xi Yiang) e o rio das Pérolas (ZhtYiang). Metade da sua área
constituída por terras conquistadas ao mar. Esta área está distribuída pela
península de Macau e pelas ilhas de Taipa e Coloane que lhe estão adjacentes. Macau
tem ligação directa com a ilha da Taipa através de duas pontes, estando a ligação
entre esta ilha e a de Coloane assegurada por um istmo. Sem terrenos de cultivo
ou grandes indústrias, Macau vive sobretudo do jogo. Neste estão também
incluídas corridas de cavalos e de cães, mas são sobretudo os casinos (alguns
dos quais a funcionar 24 horas por dia), que fazem do território a 2ª metrópole
do jogo a seguir a Las Vegas. Este facto beneficia também o sector do turismo,
que para além do movimento provocado por quem vem conhecer a cidade, faz com
que os hotéis se encham sobretudo ao fim de semana de jogadores vindos de
vários pontos da Ásia. É este vaivém constante de gente e o facto da cidade de
Macau possuir a maior densidade populacional do mundo que lhe dão uma cor e um
ritmo muito próprios. Numa cidade espartilhada entre a grande China e o mar,
com ele disputa o espaço e ao mesmo tempo cresce em altura parecendo querer
tocar o céu. Cidade antiga e moderna, onde o contraste nos surpreende a cada
esquina: é a velha calçada à
portuguesa, são os pátios e becos escondidos que fazem fronteira com avenidas
de asfalto, são paredes de pedra e argamassa que espreitam por entre torres de
vidro e de betão, é gente que passa, loira, morena, olhos redondos ou amendoados,
dialectos estranhos ou familiares, assim é Macau. São templos e palacetes,
vestígios de um passado que se enquadram numa cidade apressada e barulhenta
como uma pintura surrealista. E a observá-la, para além do tempo, estão
fortalezas e baluartes com canhões adormecidos nas ameias, guardando uma cidade
que já não sabe guardar-se a si própria, porque os perigos que a espreitam hoje
já não lhe vêm do mar. Estão dentro de si, na sombra de alguns dos que a
habitam e tecem as malhas de uma outra cidade, feia e triste, onde os homens
perderam a inocência e se vestem todos os dias de desencanto. Assim
é Macau. Mas do alto dos edifícios de betão e vidro a cidade é uma só.
Transforma-se por magia em miniatura, nós somos Guliver e Macau abarca-se num
só olhar. A noite cai devagar. A cidade é um presépio a brilhar numa profusão
de luz e cor, ilha suspensa em duas pontes, dois dragões ondulantes a brilhar
pelo mar fora. E o farol da Guia
continua a rodar, firme no seu posto como um velho general, embora a sua luz
que guiou tantos barcos, hoje ilumine quase só as torres de betão. Porém,
continua a ser guardião da sua fortaleza e o seu recorte na penumbra da noite
traz à memória a magia de outras eras. Macau, cidade do Nome de Deus, que é feito
dos outros Deuses a quem prestas culto nos templos, festas e tradições? Zangaram-se talvez os Deuses, porque o
teu nome fala apenas num só. E esse Deus que ao teu nome ligaste, saberão os que hoje te habitam, qual
deles é? E porque tem uma cidade no extremo sul da China, um nome tão invulgar? Porquê nesse local uma cidade assim?
Um europeu, o conde de Beauvoir, ao visitar Macau em 1867, escrevia: É como uma
ilusão de encontrar, às portas do Império do Meio, uma caixa de bombons antiga,
com ruínas cristãs que parecem atestar que outra coisa não houve jamais, nesta
terra longínqua, que não fossem os nossos velhos monumentos e as nossas velhas
crenças…» In Isabel Maria R. Correia Pinto, O Comportamento Cultural dos
Macaenses perante o Nascimento, Imprensa Oficial de Macau, Fundação Oriente,
2001, ISBN 99937-603-1-5.
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