quarta-feira, 17 de junho de 2015

Grandes Reportagens de Outros Tempos. Amador Patrício. «Estava, pois, assim o monarca ao facto de tudo quanto se preparava contra ele. Mas convinha esperar o momento asado para infligir o castigo; era preciso obter mais provas e apanhar toda a rede dos conspiradores»

jdact

João II e o duque de Viseu
Setúbal, 28 de Agosto de 1484
«(…) Teve depois el-rei mais precisas informações do que contra sua vida se tecia na sombra, por denúncia de Vasco Coutinho, irmão de Guterrez, que, como se disse, conhecia o segredo da conspiração. Como vasco estivesse para sair do reino, por agravos que dizia ter recebido de el-rei, foi a Sesimbra despedir-se de seu irmão, que ali se achava residindo. Procurou Guterrez dissuadi-lo de tal propósito, dando-lhe a entender que dentro em breve sucederiam coisas que lhe permitiriam ficar vantajosamente em Portugal. Insistiu Vasco na sua; e então Guterrez Coutinho, para o resolver a não partir, revelou-lhe todo o plano da conjura. Não foi preciso mais para que aquele, como bom e leal fidalgo que é, logo procurasse Antão Faria e por ele obtivesse audiência de S. Alteza. Vasco Coutinho pôs el-rei ao corrente do que o seu irmão lhe contara, não sem primeiro implorado para este o perdão da pena de morte. O rei seria morto com ferro e o príncipe Afonso levado para Sesimbra por mar e aí levantado por rei, mas só enquanto o duque de Viseu quisesse.
Estava, pois, assim o monarca ao facto de tudo quanto se preparava contra ele. Mas convinha esperar o momento asado para infligir o castigo; era preciso obter mais provas e apanhar toda a rede dos conspiradores. Por isso el-rei dissimula, não lhes dando a perceber que está prevenido do perigo que o cerca. Anda mui recatado, sempre armado de espada e punhal, e a cavalo, nunca em mula, para ter mais ágeis os movimentos. Segundo há pouco alguém me contou, a primeira vez que tentaram assassinar el-rei foi um dia em que andava a cavalo no Troino. Mas, apercebebdo-se S. Alteza, ou pelos gestos dos fidalgos, ou pela expressão dos rostos, ou ainda por segredos que entre eles trocassem, de que procuravam ocasião propícia para o ferir, colocou-se de costas para a igreja de NSª da Anunciada, e dali não se arredou até que chegasse o capitão das guardas, Fernão Martins Mascarenhas, com os seus ginetes». In Amador Patrício, Grandes Reportagens de Outros Tempos, ilustração de Martins Barata, prefácio de Caetano Beirão, Empreza Nacional de Publicidade, Minerva, 1938.

Cortesia de Minerva/JDACT