sábado, 5 de setembro de 2015

Antes da Guerra (1902-1904). Cartas do Japão. 1902. Wenceslau de Moraes. «Prometti, n’uma das correspondencias anteriores, apresentar aqui alguns conselhos aos portuguezes que queiram visitar a próxima exposição de Osaka, debaixo de um ponto de vista comercial»

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16 de Maio de 1902
«(…) Como julgo que fallar do Japão a pachorrentos filhos da terra lusitana corresponde quasi ao mesmo que referir-me a um paiz fabuloso, que fica alli para os lados da Lua ou de Saturno, ajunto ao convite alguns conselhos de velho residente, úteis, porventura, aos meus compatriotas; mas isto não vai a matar, bem entendido, ficando, pois, os conselhos para a correspondência próxima.

29 de Maio de 1902
Conselhos aos portuguezes que visitem a exposição de Osaka. Inauguração do edifício da perfeitura.
Prometti, n’uma das correspondencias anteriores, apresentar aqui alguns conselhos aos portuguezes que queiram visitar a próxima exposição de Osaka, debaixo de um ponto de vista commercial. Seguem os conselhos; mas convém antes notar que não me dirijo aos grandes ricaços, pois estes não carecem de conselhos; imagino que um empregado intelligente e de confiança é mandado ao Japão por uma ou mais das nossas casas mercantis, com o fim de estudar o commercio de exportação e de importação, e necessariamente com instrucções para ser económico nos seus gastos.
Pagam a um tal empregado, necessariamente, as viagens de ida e volta; note-se que a linha japoneza que parte de Londres, é a mais barata e bastante confortável. O empregado que estou imaginando, desembarcará em Kobe, d’onde lhe é fácil visitar attentamente a exposição de Osaka, seguindo depois para outros centros, Kyoto, Nagoya, etc., até Yokohama e Tokyo; sem duvida alguma, as indicações do nosso cônsul em Kobe, por certo não regateadas, lhe serão utilíssimas. Conte com uma despeza diária não inferior a uma e meia libra sterlina, e que a sua estada no Japão pode durar dous ou três mezes.
Deve vir munido com pequenas mas variadas amostras dos nossos productos, vinhos, cortiças, conservas, azeites, e melhor ainda se também dos nossos artigos coloniaes, marfim, borracha, café ; amostras deverá distribuir por algumas firmas respeitáveis de Kobe e de Yokohama, não com grande mira em lucros immediatos, mas principalmente com o fim de tornar bem conhecidas no meio as nossas boas producções, sobre as quaes apresentará todos os esclarecimentos requeridos. Mas não basta isto: cuidando do assumpto da exportação dos nossos productos, pode cumulativamente estudar o da importação dos productos japonezes. Eu não me illudo: não espero que se encha o Japão, mesmo em momento tão propicio, de comerciantes portuguezes; um que venha, com o duplo intuito que apresento, já pode fazer muito. Venha, pois, habilitado com um credito de dous ou três contos de réis, ou mais, exclusivamente destinados á compra de amostras dos mil artefactos da industria local, os quaes, estou bem certo, serão recebidos com alvoroço nas nossas cidades de Lisboa e Porto, e permittirão aos negociantes o ensejo de mais tarde fazerem para cá os seus pedidos com conhecimento de causa.
O individuo commissionado, seguindo sempre quanto possível as indicações desinteressadas dos nossos cônsules no Japão, terá oportunidade de relacionar-se com muitas firmas japonezas e estrangeiras, o que será da mais alta utilidade. Ora, pois, com os conhecimentos adquiridos pela própria experiência, com a sua bagagem de amostras e também… com o espirito um pouco enfeitiçado por esta terra, regressará aos pátrios lares, terá feito um grande beneficio ao commercio portuguez e contará certamente aos seus amigos que o Japão não é bem o paiz fantástico que imaginava, povoado de monstros budhistas, de adaga em punho para cortarem a cabeça aos imprudentes que d’este solo se avisinham. É facto que ha mais de 300 annos muitos dos nossos tiveram esta sorte; mas Mendes Pinto, que chegou primeiro, foi rodeado de carinhos; e Xavier, o apostolo, dizia do Japão que era o paiz do seu agrado. Desculpem-se-me gracejos; é feitio». In Wenceslau de Moraes, Cartas do Japão, Antes da Guerra (1902-1904), prefácio de Bento Carqueja, Livraria Magalhães & Moniz, Editora, Oficinas do Comércio do Porto, Porto, 1904.

Cortesia de L.Moniz/JDACT