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Cantares
do Sem-nome e de Partidas (1995)
«[…]
Como se fosse verdade
encantações, poemas
Como se Aquele ouvisse arrebatado
Teus cantares de louca, as
cantigas da pena.
Como se a cada noite de ti se
despedisses
Com colibris na boca.
E candeias e frutos, como se
fosses amante
E estivesses de luto, e Ele, o
Pai
Te fizesse por isso adormecer...
(Como se se apiedasse porque
humana
És apenas poeira,
E Ele o grande Tecelão da tua
morte: a teia).
Como se fosse vão-te amar e por
isso perfeito.
Amar o perecível, o nada, o pó, é
sempre despedir-se.
E não é Ele, o Fazedor, o
Artífice, o Cego
O Seguidor disso sem nome?
ISSO...
O
amor e sua fome».
Do
Desejo (1992)
«Quem és? Perguntei ao desejo.
Respondeu:
lava. Depois pó. Depois nada.
Porque há desejo em mim, é tudo
cintilância.
Antes, o quotidiano era um pensar
alturas
Buscando Aquele Outro decantado
Surdo à minha humana ladradura.
Visgo e suor, pois nunca se
faziam.
Hoje, de carne e osso, laborioso,
lascivo
Tomas-me o corpo. E que descanso
me dás
Depois das lidas. Sonhei
penhascos
Quando havia o jardim aqui ao
lado.
Pensei subidas onde não havia
rastos.
Extasiada, fo… contigo
Ao
invés de ganir diante do Nada.
Ver-te. Tocar-te. Que fulgor de
máscaras.
Que desenhos e rictus na tua cara
Como os frisos veementes dos
tapetes antigos.
Que sombrio te tornas se repito
O sinuoso caminho que persigo: um
desejo
Sem dono, um adorar-te vívido mas
livre.
E que escura me faço se abocanhas
de mim
Palavras e resíduos. Me vêm fomes
Agonias de grandes espessuras,
embaçadas luas
Facas, tempestade. Ver-te.
Tocar-te.
Cordura.
Crueldade.
Colada à tua boca a minha
desordem.
O meu vasto querer.
O incompossível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas
descomedida
Árdua
Construtor de ilusões examino-te
sôfrega
Como se fosses morrer colado à
minha boca.
Como se fosse nascer
E tu fosses o dia magnânimo
Eu
te sorvo extremada à luz do amanhecer.
[…]
Hilda
Hilst, Obra Poética Reunida (1950-1996), 1998, organização Costa Duarte,
Literatura brasileira século XX, Wikipédia.
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