Um itinerário ziguezagueante
«Examina-se o amplo itinerário das relações entre estratégias europeias
de inclusão e de emprego que se iniciaram com o Tratado de Roma em 1957 e que chegam até aos nossos dias. Não se
trata de uma história linear, sendo, bem pelo contrário, uma estrada sinuosa e
cheia de curvas ao longo de todos estes anos. Também não é uma história de
acumulação. Houve momentos de aceleração e outros em que se abrandou,
chegando-se quase a adormecer. Até certo ponto, as políticas de emprego e
sociais europeias algumas vezes ignoraram-se mutuamente, outras vezes correram
paralelamente com pequenos e rápidos encontros em esquinas de mais fácil
acesso.
Na pré-história, um só parceiro
O Tratado de Roma continha
uma vaporosa declaração a favor do progresso social, da melhoria das condições
de vida e de trabalho e duas séries de artigos. A primeira série dizia respeito
à livre circulação dos trabalhadores e a segunda, denominada política social, limitava-se
a uma abordagem sobre a requalificação dos trabalhadores para a qual deveria ser
criado um Fundo Social Europeu. Seguindo os mecanismos de concertação tripartida
da época, este Fundo seria gerido (e continua a sê-lo) por um Comité que
integra a UE, as organizações sindicais e as organizações patronais.
Contrariamente à sua designação, não se constitui como base da política social
europeia e irá antes jogar um importante papel nas políticas laborais, sendo
que só durante os anos noventa é que inclui o objectivo de lutar contra a
exclusão do mercado de trabalho.
Entre as duas séries de artigos existia uma diferença fundamental já
que os primeiros estavam submetidos a um processo de tomada de decisão comunitária
enquanto que os segundos, ou seja, as disposições sobre o emprego, as condições
de trabalho, a formação profissional e a segurança social, só previam a
colaboração entre os Estados-Membros e a CE era apenas outorgada a função de
promover estudos e organizar consultas. É assim que, desde o início, já se
estabeleciam regras do jogo limitadoras e não isentas de ambiguidades. A livre
circulação de pessoas, bens e capitais era um assunto comunitário, já que tinha
em vista a criação de um grande mercado, e o resto pertencia à soberania dos
Estados. Estes, por seu lado, defendiam, e continuam a defender, com muitos
ciúmes esta soberania.
Importa relembrar que as primeiras decisões sociais europeias tinham um
carácter compensatório face à reconversão que a indústria francesa teve que
realizar como resultado da negociação com o resto dos seis Estados-Membros
(especialmente com a Alemanha) que constituíam a então CEE. Deste modo, a
segunda lição que se pode extrair deste dúbio nascimento é que as decisões que
lhe estão na origem são influenciadas pelas consequências negativas, e até
certo ponto, residuais, de medidas europeias de carácter industrial baseadas nas
necessidades do mercado de trabalho de um determinado país. Isto conduz-nos à
terceira lição. Os pais da pátria europeia, concertados em acreditar que a criação
de um grande mercado eliminaria uma grande parte das causas dos históricos
confrontos militares, e criaria as condições para o crescimento económico,
acreditavam ainda firmemente que tal crescimento comportava uma melhoria generalizada
das condições de vida.
Para eles, o edifício europeu deveria ser construído sobre cimento
económico que permitiria levantar as paredes do entendimento político. Tudo o resto
viria, paulatinamente, como consequência. A política social não entrava nas
agendas europeias da época. Nestas circunstâncias, o casal não podia constituir-se porque faltava uma das partes
interessadas. Esta concepção dominante no plano europeu até à década de
sessenta, e, em boa medida, até aos nossos dias, teve que enfrentar outras
posições que defendem que:
- o crescimento económico é uma condição necessária mas não suficiente para a melhoria do bem-estar social;
- que a integração monetária, de mercados e financeira não provoca necessariamente uma aproximação da protecção social;
- que as decisões de política económica, à escala europeia, também geram desigualdades e a exclusão de pessoas, grupos sociais e territórios.
Mas este debate permanece aberto. Por isso, as estratégias europeias
sócio-laborais têm oscilado entre políticas subsidiárias e compensatórias,
entre a harmonização e a convergência, entre a função de estímulo e uma
intervenção mais activa, entre a pressão dos Estados e a legitimação das
instâncias supra e sub-estatais». In Jordi Estivill, Bridges for Inclusion, A Articulação
das Estratégias de Emprego e Inclusão Social, REAP-Portugal, Porto, 2008, ISBN
978-989-95487-9-4.
Cortesia de REAP/JDACT