domingo, 12 de maio de 2013

As Lutas Estudantis Contra a Ditadura Militar. 1926-1932. Cristina Faria. «A juventude é a grande força da vida do homem; onde há sangue novo, há vigor, há certeza de triunfo; onde há cérebro moço, há ideias que fervilham, há ânsias de renovação, há ideias que remoçam»

Cortejo fúnebre do estudante do Instituto Industrial, João Martins Branco, falecido na sequência dos acontecimentos ocorridos no dia 28 de Abril de 1931 na Faculdade de Medicina do Porto. Na foto, o féretro descendo a Rua dos Clérigos numa imponente manifestação de pesar da Invicta (30/04/1931).
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Enquadramento Político, Económico e Social da Ditadura Militar
«Em 17 de Dezembro de 1923, Cunha Leal, em sessão pública realizada na Sociedade de Geografia de Lisboa, defendia a restauração de um regime ditatorial regenerador e apelava à intervenção da única entidade que, na sua opinião, poderia salvar Portugal: as Forças Armadas, símbolo máximo da Pátria, ‘exemplo de disciplina’ e ‘garante da ordem’. Nesse ano em que a crise profunda, com início em finais de 1919, inícios de 1920, atinge um dos seus pontos altos com o fim do ‘pão político’, o capitão do Exército, mais tarde fundador da União Liberal Republicana (ULR), adivinha o papel preponderante que as Forças Armadas assumirão na ‘salvação nacional’ enquanto instrumento consensual entre as várias sensibilidades políticas presentes no momento e referência última da legitimidade do Estado.
E, de facto, quando em Braga os militares avançam com o movimento em 28 de Maio de 1926, sob a liderança do gen. Gomes da Costa, fazem-no com o objectivo explícito de salvar a Pátria da governação dos ‘bonzos’ do Partido Republicano Português (PRP). Mais do que instaurar um programa político definido, o levantamento preocupar-se-ia em arredar definitivamente da vida política portuguesa a governação corrupta, demagógica e autoritária dos democráticos de António Maria Silva, incapaz de solucionar, ou pelo menos minimizar, a crise financeira, económica e social endemicamente instalada no país. Urgia, portanto, substitui-la por um ‘regime de ordem’, de ‘excepção’, ‘que saneasse as finanças, relançasse a economia na metrópole e nas colónias e criasse as condições de uma nova ordem político republicana’.
As razões do agravamento da crise devem procurar-se no contexto de conflitualidade e instabilidade produzido pela entrada de Portugal na I Guerra Mundial. Os efeitos da economia de guerra ameaçam o país de fome. A carestia dos bens essenciais, o racionamento dos géneros alimentares e a descida dos salários agrícolas e industriais provocam, nas grandes cidades de Lisboa e Porto, assaltos a lojas e motins populares numa onda de agitação social que lança um movimento reivindicativo sem precedentes durante toda a República. Com a ‘República Nova’ de Sidónio Pais a agricultura conhece algum incremento produtivo através de uma política de favorecimento do sector, mas o movimento grevista só é contido pelas medidas brutais de repressão que lhe são infligidas.
No fim da guerra, a derrota das várias iniciativas militares pró-monárquicas reintroduz progressivamente as liberdades e os mecanismos constitucionais suspensos desde o golpe sidonista e a República tenta normalizar a sua situação, sobretudo através do Partido Socialista. Todavia, o desemprego mobiliza os protestos do movimento social contra a especulação, o açambarcamento e a diminuição do poder de compra por parte dos trabalhadores assalariados e dá-se entrada nos anos de 1920 / 21 com um adensamento das lutas e greves gerais. A balança de pagamentos acusa a diminuição do fluxo de remessas de emigrantes do Brasil, o escudo cai vertiginosamente e perde 20 vezes o seu valor em relação à libra. Consequentemente, a inflação galopante não permite que a subida dos salários seja proporcional à subida dos preços e ao aumento do custo de vida e a reacção social extrema-se.
As ‘revoltas da fome’ registadas nos anos de 1922 / 23 levam o Partido Democrático (PD) a favorecer os preços agrícolas como forma de conquistar os sectores mais moderados do campo e assegurar os abastecimentos na cidade e, em 19 de Agosto de 1923, Joaquim Ribeiro, ministro da Agricultura, abole o pão político, o pão barato subsidiado das cidades. O consequente aumento deste género alimentar determina violentas manifestações de protesto entre as classes de rendimentos inferiores motivando o que Fernando Medeiros designou como o último sobressalto da iniciativa sindicalista. Três meses depois, Ginestal Machado coloca o tenente-coronel Ferreira do Amaral à frente da Polícia e, em 24 de Dezembro desse mesmo ano, o governo de Álvaro de Castro nomeia Sá Cardoso para a pasta da Guerra; juntos, protagonizam o endurecimento da repressão contra o movimento operário e sindicalista.

A juventude é a grande força da vida do homem; onde há sangue novo, há vigor, há certeza de triunfo; onde há cérebro moço, há ideias que fervilham, há ânsias de renovação, há ideias que remoçam. In Virgílio Marinha de Campos, Liberdade, 27/4/1930

E o ano de 1924 começa com as ‘jornadas de Fevereiro’ contra a vida cara e o fascismos. Entre os dias 17 e 22 deste mês, têm lugar inúmeros comícios e manifestações organizadas por forças políticas e sindicais de esquerda contra as tentativas de instauração de um regime ditatorial de direita e exigindo a concretização de medidas tendentes à melhoria das condições de vida dos trabalhadores». In Cristina Faria, As Lutas Estudantis Contra a Ditadura Militar, 1926-1932, Edições Colibri, Lisboa, 2000, ISBN 972-772-201-6.

Cortesia de E. Colibri/JDACT