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Ao contrário do que ocorreu com os seus estudos da epigrafia de Óstia, Wickert
nunca conseguiu publicar tal Supplementum.
Deixou a Academia e a Epigrafia e empenhou-se numa carreira universitária, na
Universidade de Konigsberg, primeiro, e, depois, em 1939, na de Colónia, onde se dedicou aos estudos mommsenianos,
de alma e coração. Mau grado, porém, todas essas mudanças e os transtornos
causados pela II Guerra Mundial, logrou conservar aqueles materiais, que, por
fim, depositou, em 1956, na Academia
de Berlim, quando se voltou a vislumbrar a possibilidade de se realizar esse CIL II Suppl. 2, projecto que,
infelizmente, também se malogrou.
Trinta
anos mais tarde, avançados que estavam já os trabalhos de uma segunda edição do
CIL II, a Academia de Berlim teve a
gentileza de emprestar essa documentação, durante uns anos, à redacção central
do CIL II, sediada então na Kommission für Alte Geschichte und Epigraphik
des Deutschen Archaologischen Instituts de Munich, donde, sob minha
direcção, Vedder retirou as informações nela contidas, integradas de
seguida no Ficheiro Central do projecto. Os fascículos da nova edição já
publicados dão fé, sem margem para dúvidas, da envergadura e da importância
daquelas informações. Precioso exemplo disso é uma singela nota que, há mais de
um século, a 11 de Maio de 1905, Francis
Haverfield remeteu à Academia de Berlim, que diz textualmente:
Diary of Col. Dixon R. A. for 1809-10, now being edited by major Leslie,
mentions that (while travelling in Portugal), Col. D(ixon) put up for the night
at the foot of a Roman Monument with inscription CN. IVNIO CN. F. QVIR. GALLO II VIR. TVRRANIA GLEA GENERO OPTIMO a relic no
doubt of the town of Medobriga, which stood here.
Alexander
Dickson, então coronel, mais tarde general Sir Alexander Dickson, 1777-1840,
era oficial do Exército Britânico, onde prestava serviço na Artilharia Real.
Participou, desde 1809 até 1813, nas Guerras Peninsulares contra as tropas
napoleónicas, em que brilhantemente se distinguiu, a ponto de Sir Wellesley,
mais tarde Lord Wellington, o encarregar do comando de toda a artilharia das
tropas britânico-hispano-lusas aliadas, com que ainda participou na batalha de
Waterloo. Durante todas essas e outras campanhas, Dickson permanecia fiel ao
seu costume de ir escrevendo um diário, que, aquando da sua morte, foi entregue
pelo filho, o general Sir Collingwood Dickson, juntamente com a sua
correspondência militar e outros relevantes papéis, ao Royal Regiment of Artillery em Woolwich (Londres). Por fim, no ano
de 1905, toda essa documentação foi
editada em cinco tomos, a cargo da Royal
Artillery Institution, pelo comandante John Leslie.
Esta
é, evidentemente, a edição a que Haverfield alude, na sua missiva, como sendo de próxima publicação. O relato do
episódio em questão, feito por Dickson no seu diário, encontra-se no segundo
tomo do manuscrito editado, relativo ao ano de 1810, e mostra, por um lado, que Haverfield não reproduzia
correctamente nem as circunstâncias do achado, supostamente fortuito: put up for the night at the foot of a
Roman Monument nem o texto da inscrição. Refere, todavia, sem margem para
dúvidas, o local onde o achado se produziu: São Salvador de Aramenha, concelho
de Marvão, distrito de Portalegre, que era para Dickson o sítio da antiga Meidobriga,
reflectindo, assim, a communis opinio da erudição
portuguesa da época, que localizava ali a cidade lusitana de Medobriga
conquistada por Q. Cassius Longinus em 48 a. C. e os Medubrigenses qui et plumbari de Plínio,
que como Meidubricenses aparecem na inscrição dos populi que dedicaram a Trajano
o arco da ponte de Alcântara».
In
Juan Manuel Abascal, Universidad de Alicante, Rosario Cebrián, Parque
Arqueológico de Segóbriga, José d’Encarnação, Universidade de Coimbra, Marvão e
Ammaia ao tempo das Guerras Peninsulares, IBN MARUAN, 2009, Edições Colibri,
Câmara Municipal de Marvão, ISBN 978-972-772-876-3.
Cortesia
de E. Colibri/CM de Marvão/JDACT