segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Elogio do Silêncio. Marc Smedt. «… as forças telúricas operam no silêncio, elas modificam as estruturas e os comportamentos; um local sagrado fala por si; a pedra torna-se falante, como a floresta e as suas clareiras…»

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Os estados do silêncio
«(…) O silêncio dos mosteiros, dos claustros, dos monges, de todos aqueles que praticam a ciência do retiro encantado (Michaux). Durante um ano o aprendiz de maçon é convidado a meditar, ouvir, calar-se. E os Reis Magos inclinam-se sem palavras. Existe o silêncio dos lugares, dos quais Marie-Madeleine Davy nos diz: … as forças telúricas operam no silêncio, elas modificam as estruturas e os comportamentos; um local sagrado fala por si; a pedra torna-se falante, como a floresta e as suas clareiras; a água murmura a sua mensagem; os lugares sagrados assemelham-se à linguagem dos pássaros. Qualquer local se pode tornar um templo, o santo dos santos vibrante de segredos..., revelando-se no não-dito. Lugar de contacto com o fundo abissal do ser.
No encanto, devemos dizer que o verdadeiro segredo recua sempre, inacessível. Existe o silêncio dos animais, o labuloso silêncio do gato e de todos os felinos, sem frases, e o comovente silêncio dos cães. O dos caçadores à espera, o dos pescadores que meditam de linha na mão. O silêncio dos cegos, dos surdos, dos mudos: imagem oval no ecrã de televisão ou um homem falando por sinais a outros. O antepassado do jornal satírico Haro Kiri chamava-se Le Petit Silence Illustré. Editado em 1955 por Jacques Sternberg, teve sete números e foi o primeiro fanzine, a única revista que não tem nada a dizer. O seu lema: … diz-me o que calas, dir-te-ei quem és! Citemos alguns provérbios populares franceses e estrangeiros.
  • Em França diz-se: O silêncio é de ouro; 
  • Na Alemanha: Cala-te ou diz qualquer coisa melhor que o silêncio; 
  • Em Israel: Saber calar-se é mais difícil que falar bem; 
  • Em Itália: Aquele que nada sabe, sabe o suficiente se souber manter-se em silêncio; 
  • Na Roménia: O silêncio também é uma resposta; 
  • Em Espanha: Perceber, ver e calar-se, senão a vida torna-se amarga; 
  • Na Dinamarca: Aquele que quer economizar deve começar pela sua boca; 
  • Na Turquia: A boca do sábio está no seu coração, o coração do tolo está na sua boca; 
  • Na China: Existe aquele que falou toda a sua vida e nada disse, e aquele que não chegou a abrir a boca e apesar disso nunca ficou sem nada dizer; 
  • Por fim, no Japão, diz-se que: As palavras que jamais foram pronunciadas são as flores do silêncio.
Tantos silêncios! Existe também o da esfinge, o silêncio dos perfumes, odores e cores, o silêncio da cerimónia do chá, o silêncio da noite e dos sonhos, o silêncio de cada gesto. O silêncio das estações e dos seus dias». In Marc Smedt, Elogio do Silêncio, 1986, Sinais de Fogo Publicações, tradução de Sérgio Lavos, colecção XIS (livros para pensar), Público, 2003, ISBN 989-555-029-4.

Cortesia de Público/JDACT