S. Tomé e Príncipe
Cortesia de wikipedia
Visão
Vi-te passar, longe de mim,
distante,
como uma estátua de ébano
ambulante;
ias de luto, doce, tutinegra,
e o teu aspecto pesaroso e
triste
prendeu minha alma, sedutora
negra;
depois, cativa de invisível
laço,
(o teu encanto, a que ninguém
resiste)
foi-te seguindo o pequenino
passo
até que o vulto gracioso e lindo
desapareceu, longe de mim,
distante,
como uma estátua de ébano
ambulante.
In Caetano da Costa Alegre
«A questão da identidade
nacional e, consequentemente, a tomada de consciência de pertença a um lugar,
ou uma nação, salta para a ribalta com maior enfoque a partir do movimento
romântico, desde os finais do século XVIII. Contudo, a identidade configura um
tema complexo devido ao carácter polissémico no sentido de encerrar uma grande diversidade
de conotações. Porém, na nossa dissertação, propomos falar da identidade nacional
focando a política de afirmação e de construção da identidade tal como foi tratada
pelo romantismo, visto o autor de que nos ocupamos, Caetano da Costa Alegre ter
vivido e escrito a sua obra em finais do século XIX.
Durante muito tempo as
sociedades utilizaram a história para tentar abrigar povos de diferentes
origens e, consequentemente, de diferentes culturas numa unidade que era dado o
nome de nação. Firmados nesse princípio, visavam a construção da identidade de sentido
agregador com o objectivo fixo da “expressão
de um carácter nacional”. Assim, considerava-se negativa a diversidade
cultural na composição de determinada nação, valorizando-se na história aquilo
que convergia para a evolução tomada como prática reguladora da visão da
identidade.
Contudo, essa visão
começa a mudar a partir do momento em que nas sociedades contemporâneas. Nelas,
vão surgindo diferentes vozes que reivindicam o estatuto da diferenciação,
apoiadas numa revisitação do passado histórico onde encontram formas de
representação de determinada identidade diferenciada, se não propriamente
nacional, de certa maneira cultural própria, e assim insistirem mais ideia de
pluralidade do que de unidade na composição de uma sociedade. Enquanto uns se
valiam do princípio da história linear para afirmar a identidade individual
outros apontavam o princípio não sequencial da história, decorrente dos grupos
minoritários para a formação de uma identidade cultural, ou seja, identidade colectiva.
A identidade individual era formada através das transformações históricas, já a
identidade cultural era reivindicada a partir da história fragmentada por
favorecer as conexões entre tempos de passado e de presente. Esta representa um
papel fundamental na elaboração da consciência nacional, pois tende a formar os
pontos de convergência do sentimento de identidade comprimido durante muito
tempo pelo opressor favorável à assimilação. É sob este ponto de vista
problemático que se pode colocar com mais amplitude a questão de uma comunidade
que visa a construir a sua identidade nacional.
A narrativa da nação
contada nas histórias e nas literaturas nacionais fornece estórias, imagens,
cenários, panoramas, símbolos e rituais nacionais que servem de suporte que darão
sentido à visão de nação que se quer para uma determinada colectividade. Assim,
como forma de encontrar uma identidade de características próprias, povos de
diferentes culturas procuraram mecanismos através dos quais pudessem encontrar alternativas
que possibilitassem o aparecimento dos aspectos culturais específicos de uma
dada colectividade. Esse aspecto torna-se ainda mais pertinente quando se
refere a identidade de um determinado grupo que nunca teve a sua história
contada até ao momento em que começa a ser problematizada. Segundo Hall
e referenciando Koberna Mecer, “a identidade
somente se torna uma questão quando está em crise, quando algo que se supõe
fixo, coerente e estável é deslocado pela experiência da dúvida e da incerteza”.
O conceito da identidade
global começa a ser questionado quando o grupo minoritário se recusa à condição
de cultura periférica, marginal e reivindica um estatuto autónomo interior do
campo instituído e onde se vê incluída. Essa nova forma de pensar transforma-se
em desafio para as literaturas emergentes responsáveis pela elaboração da consciência
nacional contemporânea e, portanto, por uma nova forma de rever a questão da
história de modo a que esta contemple a história dos grupos periféricos. Assim,
no intuito de afirmar uma identidade nacional, o passado histórico serviu como
uma forma de afirmar ou constituir um imaginário nacional pautado numa visão simbólica
de identidade.
Enquanto movimento
histórico, o Romantismo é resultado de duas revoluções, a Revolução Francesa e a Revolução
Industrial, e coincide com a ascensão política e económica da burguesia
europeia. O romantismo foi gerado a partir de uma escola que se pautava pela
evocação do popular, do medievo, do exótico, pela exaltação da liberdade:
- liberdade política, a vontade do rei deixou de ser soberana para o romântico;
- liberdade moral, a norma de moralidade não é construída pelos ditames da razão, muito menos pelas crenças religiosas, apesar de reconhecer a necessidade afectiva de Deus e da religião;
- liberdade nos sentimentos, o romântico deixava-se arrastar pelas emoções violentas.
E, sobretudo, pelo culto
do ‘eu’
individual. O objectivismo absorvente e a sujeição às regras do neoclassicismo serão
postos de lado para dar lugar a um espírito individualista, caracterizado pela exaltação
da própria personalidade do poeta romântico». In Instituto Camões.
Cortesia de I.
Camões/JDACT