A Vida do Cérebro
«A minha advertência provocou um silencioso desconfortável que se converteu
em impaciência e que, após alguns minutos, ocasionou um comentário de um dos
meus colegas de painel, um ilustre diplomata de renome internacional; Professor
Goldberg aquilo que está a dizer é extremamente interessante mas esta
conferência é sobre a mente, não é sobre o cérebro.
Atónito e de queixo caído perante a possibilidade de tal comentário que
revelava tanta ignorância ter sido proferido pela minha erudita companhia, fiquei
a ponderar numa réplica impetuosa em defesa da conexão mente/cérebro, mas decidi
deixá-la de lado, mais por razões sociais do que intelectuais.
Eis a mensagem simples que pretendo transmitir; tal como o mais leve
movimento do seu corpo depende do trabalho efectuado por um grupo particular de
músculos, também a mais diminuta e aparentemente esquiva actividade mental necessita
dos recursos do seu cérebro. E até a mais simples actividade mental pode ser
interrompida por uma doença cerebral Assim, à medida que embarcamos com humildade,
mas também com coragem, na exploração dos estados da mente em diversas fases da vida e
na natureza da sabedoria, não podemos alhear-nos do cérebro. A frase: ‘É
claro que estamos a falar do cérebro, estupido!’ é o lema principal desta
conversa. Por favor não tome isto como uma ofensa pessoal.
O envelhecimento cerebral resume-se à melancolia e à ausência de
vitórias?
Não estou de acordo. De facto, vou recorrer a toda a energia mental que
resta no meu envelhecido cérebro para defender a tese de que o
envelhecimento da mente apresenta algumas vantagens que são apenas alcançadas
com a idade. Esta é a mensagem central.
Urge que deixemos de encarar o envelhecimento da mente e do cérebro apenas
em termos de declínio mental e perdas. O envelhecimento da mente é também um processo
em que há ganhos. Com a idade, podemos perder a boa memória e a capacidade de
concentração prolongada. À medida que nos tornamos mais velhos, podemos ganhar
sabedoria ou, pelo menos, experiência e competência, qualidades que não são de
forma alguma de desprezar. Quer as perdas quer os ganhos das mentes que
envelhecem são muito mais graduais do que abruptos. Estão enraizados naquilo
que acontece com os nossos cérebros. Já foram escritos muitos livros sobre as
perdas das mentes que envelhecem. Este diálogo é dedicado aos ganhos e ao
balanço entre as perdas e os ganhos.
A nossa cultura exige um final feliz para cada história. Por ter passado a minha juventude num ambiente mais hostil, considero este aspecto divertido, apesar de ter vivido neste lado do Atlântico nas últimas três décadas. Recordo uma entrevista televisiva que vi depois de um acontecimento catastrófico ocorrido nos últimos anos. Depois de um especialista bem-falante ter traçado uma imagem bastante negra e infelizmente precisa da questão em apreço, o entrevistador disse num tom de exigência e impaciência: ‘Mas o que tem a dizer para tranquilizar o público?
Nesse momento disse para mim mesmo: “Que interessante idioma cultural! Tem de haver um fim feliz!»
In Elkhonon Goldberg, O Paradoxo da Sabedoria, 2005, Forum da Ciência,
PE-A, 2008, ISBN 978-972-1-05857-6.
Cortesia de PE-A/JDACT