«Seria interessante
saber até que ponto o prestígio dos Cavaleiros
do Templo junto da Santa Sé foi importante para o reconhecimento, pelo papa,
do reino português. É na década seguinte que a Ordem do Templo vive os momentos de maior expansão em Portugal, sob
o mestrado de Gualdim Pais. Regressado do próximo Oriente em 1150, onde havia
participado em actividades militares no quadro da II Cruzada, este cavaleiro
foi de imediato nomeado mestre daquela milícia.
Na década de 60 do
século XII, os templários tinham já à sua guarda um conjunto de fortalezas a norte
do Tejo, o que exigia aos cavaleiros um enorme esforço e responsabilidade, já
que, por essa altura, elas constituíam o essencial da defesa do território português.
Durante o governo de Gualdim Pais, a Ordem do Templo vai construir vários castelos (Pombal, Tomar,
Almourol),
promover obras de reparação noutros (Penas Roias e Longroiva, por exemplo) e
conceder forais a várias populações (Redinha, Ferreira, Tomar,
Pombal,
Castelo
de Zêzere), manifestando assim o interesse da milícia em regulamentar a
vida local e em criar novos incentivos para o povoamento. Em 1190, novo avanço
almoada atinge gravemente a Estremadura portuguesa, chegando o castelo
de Tomar a ser cercado, mas não tomado; esta fortificação seria uma das
mais seguras da época, como atesta o facto de em 1211 o rei Sancho I aí depositar
parte do tesouro real. Cinco anos depois, 1195, morria o tão carismático
mestre, com cerca de 75 anos de idade. Durante quase cinco décadas, desde o seu
aparecimento em Portugal até aos anos 70, a Ordem
do Templo tinha sido o único auxiliar do monarca na Reconquista, o que
esteve na origem da maior parte da sua base territorial. Fruto de várias doações,
os templários passaram a dominar imensas zonas a sul do Mondego, nomeadamente
no que respeita às vias de acesso a Coimbra. Não é pois de estranhar que os
cavaleiros pretendessem igualmente controlar o vale do Tejo, tanto mais que
eram detentores dos castelos da Cardiga e do Zêzere e que o território
de Tomar
tinha aquele rio como limite sul. Mas neste desejo de controlo de uma das
principais vias de comunicação fluvial, rei e cavaleiros tinham pretensões
opostas:
- por esta razão, a criação do município de Abrantes, a quem o rei concede foral em 1179, e a doação de Guidintesta aos hospitalários, ocorrida em 1194, revestem-se de um significado especial, já que impedem aos templários o domínio exclusivo do curso intermédio do Tejo.
Ao mestre Gualdim Pais sucedeu Lopo Fernandes que, contudo, terá
exercido a dignidade mestral até 1206, data em que surge na documentação o nome
do mestre Fernando Dias, logo seguido, em 1208, do de Gomes Ramires. Assiste-se
neste período a uma tentativa de “lusitanização” dos templários
peninsulares, atestada pela presença no governo provincial da Ordem de mestres de origem portuguesa e
enquadrada num processo de autonomização da estrutura dos templários hispânicos
face à casa-mãe do ultramar. A larga faixa dominada pelos templários junto à
fronteira leonesa, associada ao controle do território junto ao Tejo, até Tomar,
se por um lado, permitia a preponderância dos cavaleiros portugueses na
estrutura provincial da Ordem, isto
é, a referida “lusitanização”, por outro, podia vir a criar problemas graves
ao monarca português em caso de guerra com o reino vizinho». In
Maria Cristina A. Cunha, Estudos sobre a Ordem de Avis, séculos XII-XV,
Faculdade de Letras, Biblioteca Digital, Porto, 2009.
Cortesia da Faculdade de Letras do Porto/JDACT