Lamentação de Kiya, Último Sacerdote de Aketaton, na Morte de Nefertiti
A bela que veio,
soberana da graça,
senhora do norte e do sul,
a de semblante claro,
a amada de Aton,
a eternamente bela
Nefer Neferu Nofrete Nefertiti
ao 11.315º dia de vida
olhou o sol escurecendo e clamou:
O Senhor da Eternidade,
quando despontas magnífico,
ó Disco Vivo,
tu és resplandescente,
belo e poderoso.
O amor que inspiras é grande e
único.
Os teus raios acariciam-me o
rosto,
o teu fulgor suaviza o meu peito.
Ó Deus majestoso
que a Ti mesmo te criaste,
ó Deus que formaste a Terra,
e modelaste tudo o que existe,
enche-me o coração de alegria!
Mas ao 11.316º dia,
a água, o fogo, a madeira, o metal, a terra,
os elementos l-2-3-4-5,
tomaram a jovem Nefertiti
e invadiram-na
de cólera, amargura, acidez, dor e vento
tempestuoso.
Todo o sangue terminou
o seu percurso no corpo de Nefertiti.
O frio do metal,
o negro da água,
o incandescente fogo
secaram-lhe, para sempre, no rosto voluptuoso
a ardência do olhar divino.
Mas Nefertiti viverá
até que o cisne fique preto
e o corvo fique branco,
até que as montanhas se movam
na direcção dos rios e dos mares
e surjam na terra
os homens de raça dourada
que criarão a cidade do Sol.
Poema de Orlando Neves, in ‘Máscaras’
In Orlando Neves, Máscaras, edições Sol XXI, Tipografia Voz de Lamego,
1997, ISBN 972-8183-52-6.
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