terça-feira, 1 de outubro de 2013

A Alma Secreta de Portugal. Portugal Imaginal. A ‘Fonte’ da Alma Secreta. «Como hermeneuta da literatura, aprofunda os grande temas enunciados pelo génio de Amarante, com destaque para o aprofundamento relativo à temática que gira à volta da ‘saudade’»

Cortesia de wikipedia e jdact

A Quinta da Regaleira e o Portugal Imaginal. Entrevista com José Manuel Anes 2ª Parte. Da evidência da Identidade Imaginal Portuguesa à necessária Re-criação da tradição

(…)
José: É imaginativo e corresponde a uma característica desse ar criador grandioso do Carvalho Monteiro e do Luigi Manini, que vão dar uma expressão cristã a um mito pagão numa continuidade absoluta. Não há descontinuidade nenhuma. Ele vai cristianizar, com essa fecundação de Leda por Zets, fecundação por obra e graça do Espírito Santo. Espírito Santo que está representado pela pomba.
Paulo: A pomba do Espírito Santo aqui poderá significar, no pensamento dos seus autores, o advento da era do Espírito Santo...
José: Repare, o Espírito Santo é causa e efeito. Eu penso que eles aqui dão uma grande piscadela de olho ao leitor destes símbolos e deste conjunto do imaginário da Regaleira dizendo: aqui está a concepção da imaculada Leda, concepção divina, por Zeus, por obra e graça do Espírito Santo. Há uma piscadela de olho dizendo: atenção, estas linguagens são universais e, quer o paganismo quer o cristianismo, embora em registos diferentes, dizem a mesma coisa, que é: a fecundação de uma matéria virgem, sempre virgem por mais fecundada que seja, da qual nascem, naturalmente, Pólux ou Cristo. Portanto, o Espírito Santo está na raiz deste processo, mas também pode ser efeito. O Espírito Santo é o mediador e propicia essa união, a fusão do masculino e do feminino, do espírito e da matéria, mas, por outro lado, é também o resultado dessa união. Essa ambiguidade do Espírito Santo tem uma dimensão activa e masculina, mas também tem essa dimensão feminina. É, digamos, a Sekina, é a presença de Deus, como aparece na tradição judaica.
Paulo: O Espírito Santo era feminino segundo o Evangelho dos Hebreus, e para os gnósticos era a Sophia...
José: Mas a Sophia é o equivalente à alma do mundo, a Anima Mundhi. E quando se quer valorizar o imaginário, temos de nos recordar de que o objectivo desses grandes nomes desta espiritualidade, como Corbin, Jung, Durand, etc., era exactamente a valorização da alma do mundo, a recuperação, a reconquista da alma do mundo. Esse é o grande desafio». In Quinta da Regaleira, Sintra, 2002.

As três colunas da Cultura Portuguesa. Entrevista com António Cândido Franco
«António Cândido Franco nasceu em Lisboa. Tem consagrado grande parte da sua investigação ao estudo da obra de Teixeira de Pascoaes. Para além de lhe dedicar o doutoramento, tem dez obras publicadas sobre o grande vate de Amarante. Cândido Franco percorre a obra do génio saudosista, com a mesma intensidade de alma e coração que o bardo da Renascença peregrinava pelas alturas do Marão, em plena comunhão com o espírito da serra, esse mesmo espírito que dois milénios antes foi cultuado pelos povos galaicos com o nome de Reve Marândico. Mas o trabalho hermenêutico de Cândido Franco ultrapassa a obra de Pascoaes no seu sentido estrito. Como hermeneuta da literatura, aprofunda os grande temas enunciados pelo génio de Amarante, com destaque para o aprofundamento relativo à temática que gira à volta da saudade.
António Cândido Franco tem tido, também, ampla actividade no âmbito da crítica literária, com largas dezenas de artigos publicados, nomeadamente no Jornal de Letras. A musa inspiradora da literatura paira sobre a sua escrita, seja na prosa ensaística ou ficcional. As suas palavras cruzam-se harmoniosamente, transportando o sentido do seu pensamento com a mesma naturalidade que o rio encontra as águas profundas do oceano. O seu estilo recorda-nos, inevitavelmente, o padre António Vieira; a sua abordagem filosófica, o pensamento de António Telmo.
Por coincidência, publicamos esta entrevista no cinquentenário da morte física de Teixeira de Pascoaes (1877-1952), razão pela qual não podemos deixar de prestar sentida homenagem ao grande bardo lusitano, autêntico Midas da literatura, pois tudo o que tocava com a sua escrita transformava na harmonia dourada da beleza poética. De tal modo por ele fluía a água cristalina das Musas que, por vezes, nas suas poesias, ele próprio parecia transformar-se nessa água abençoada pelos espíritos da natureza. Para ti, Teixeira, que hoje vives livre no teu Marão imaginal, um forte abraço em espírito... Sabemos que estás aí, sabemos que o teu Marão é mais verdadeiro do que todas as luzes fugazes e efémeras, nascidas no seio de Maya para alimentar as ilusões dos humanos.

In Paulo Loução, A Alma Secreta de Portugal, Ésquilo Edições & Multimédia, 2004, ISBN 972-8605-15-3.

Cortesia de Ésquilo/JDACT