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e wikipedia
Eu.
Monólogo de uma sombra
[…]
Tal
a finalidade dos estames!
Mas
ele viverá, rotos os liames
dessa
estranguladora lei que aperta
todos
os agregados perecíveis,
nas
eterizações indefiníveis
da
energia intra-atómica liberta!
Será
calor, causa ubíqua de gozo,
raio
X, magnetismo misterioso,
quimiotaxia,
ondulação aérea,
fonte
de repulsões e de prazeres,
sonoridade
potencial dos seres,
estrangulada
dentro da matéria!
E o
que ele foi: clavículas, abdómen,
o
coração, a boca, em síntese, o Homem,
engrenagem
de vísceras vulgares,
os
dedos carregados de peçonha,
tudo
coube na lógica medonha
dos
apodrecimentos musculares.
A
desarrumação dos intestinos
assombra!
Vede-a! Os vermes assassinos
dentro
daquela massa que o húmus come,
numa
glutoneria hedionda, brincam,
como
as cadelas que as dentuças trincam
no
espasmo fisiológico da fome.
É
uma trágica festa emocionante!
A
bacteriologia inventariante
toma
conta do corpo que apodrece...
E
até os membros da família engulham,
vendo
as larvas malignas que se embrulham
no
cadáver malsão, fazendo um s.
E
foi então para isto que esse doudo
estragou
o vibrátil plasma todo,
à
guisa de um faquir, pelos cenóbios?!...
Num
suicídio graduado, consumir-se,
e
após tantas vigílias, reduzir-se
à
herança miserável dos micróbios!
Estoutro
agora é o sátiro peralta
que
o sensualismo sodomita exalta,
Nnutrindo
sua infâmia a leite e a trigo...
Como
que, em suas clélulas vilíssimas,
há estratificações requintadíssimas
há estratificações requintadíssimas
de
uma animalidade sem castigo.
Brancas
bacantes bêbadas o beijam.
Suas artérias hírcicas latejam,
Suas artérias hírcicas latejam,
sentindo
o odor das carnações abstémias,
e à
noite, vai gozar, ébrio de vício,
no
sombrio bazer domeretrício,
o
cuspo afrodisíaco das fêmeas.
No
horror de sua anómala nevrose,
toda
a sensualidade da simbiose,
uivando,
à noite, em lúbricos arroubos,
como
no babilónico sansara,
lembra a fome incoercível que escancara
lembra a fome incoercível que escancara
a
mucosa carnívora dos lobos.
Sôfrego,
o monstro as vítimas aguarda.
Negra
paixão congénita, bastarda,
do
seu zooplasma ofídico resulta...
E
explode, igual à luz que o ar acomete,
com
a veemência mavórtica do aríete
e os
arremessos de uma catapulta.
Mas
muitas vezes, quando a noite avança,
hirto,
observa através a ténue trança
dos
filamentos fluídicos de um halo
a
destra descarnada de um duende,
que
tateando nas ténebras, se estende
dentro
da noite má, para agarrá-lo!
Cresce-lhe
a intracefálica tortura,
e de
su’alma na caverna escura,
fazendo
ultra-epiléticos esforços,
acorda,
com os candeeiros apagados,
numa
coreografia de danados,
a
família alarmada dos remorsos.
É o
despertar de um povo subterrâneo!
É a
fauna cavernícola do crânio
Macbeths
da patológica vigília,
mostrando,
em rembrandtescas telas várias,
as
incestuosidades sanguinárias
que
ele tem praticado na família.
[…]
Poema de António dos Anjos, in “Eu e Outras Poesias” 1912
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