Maio de 1835. Londres. Abertura oficial
da Estação de Festas
«(…) Tudo isso pareceria muito sórdido
se pensasse nos detalhes por um longo tempo ou se não tivesse o bastante para
beber. Durante o ano anterior, Riordan descobrira que estava precisando beber
cada vez mais para impedir-se de pensar nos detalhes. O seu cantil de prata se
achava sempre presente no bolso do seu casaco, e, no momento, ele se encontrava
muito sóbrio para seu gosto. Riordan alcançou o cantil, apenas para ser interrompido
pela aproximação de um lacaio carregando uma bandeja de prata e uma carta
selada. Milorde, perdoe-me a intrusão. Isto chegou para o senhor com muita urgência.
Riordan estudou a carta com curiosidade. Ele não tinha interesse em política
nem em nenhum investimento de negócios que requeresse a sua atenção. Em resumo,
não era de modo algum o tipo de homem que as pessoas procuravam com a espécie
de urgência implicada pelo lacaio. Riordan rompeu o selo e leu as quatro linhas
curtas escritas a tinta por Browning, o advogado da família. Então releu-as, na
esperança de que a repetição tornasse o bilhete menos estranho, menos
apavorante. Não são más notícias, eu espero... Os olhos castanhos de lady
Meacham se arregalaram com preocupação, provando que ele estava tão pálido
quanto se sentia. Não más notícias..., a pior notícia. E ela estaria por toda a
cidade de Londres dentro de um dia, mas Londres nunca ouviria aquilo de
Riordan. Ele não estava pronto para dissimular para o seu último caso amoroso,
no meio da exposição de artes da Academy. Assim, reuniu o que lhe restava de
bom senso e deu um sorriso extravagante para lady Meacham, a fim de mascarar as
suas emoções crescentes. Minha querida, eu lamento, mas os meus planos mudaram.
Ele fez uma reverência curta e sardónica. Se me der licença... Parece que eu me
tornei pai. Riordan pegara o seu cantil, mas agora o beber pareceu-lhe inútil.
Não havia conhaque suficiente no mundo para aliviar aquilo. Ele ia precisar de
ajuda. Aceitaria qualquer ajuda que pudesse obter.
Eu aceitarei qualquer coisa que tiver.
Maura Harding estava sentada erecta, com mãos enluvadas e cruzadas
comportadamente no colo. Ela se esforçava para soar afável em vez de
desesperada. Não estava desesperada. Maura forçou-se a acreditar na quase ficção.
Se ela não acreditasse, ninguém mais acreditaria. O desespero a transformaria
num alvo fácil. Pessoas podiam sentir desespero como cães farejavam medo. De
acordo com o pequeno relógio preso ao corpete do seu vestido, eram 10h30 da manhã.
Ela viera directo da carruagem que transportava correspondência para a Agência de
Encaminhamento da sra. Pendergast para jovens ladies de boa criação e precisava
de um trabalho até o fim do dia. A sra. Pendergast espiou sobre a borda dos
seus óculos e hesitou. Eu não vejo referências aqui. O peito volumoso da sra.
Pendergast inflou em desaprovação quando ela fez o pronunciamento. Maura
respirou fundo, em silêncio repetindo o mantra que a sustentara durante a longa
jornada de Exeter: em Londres haverá ajuda. Não desistiria agora simplesmente porque
não tinha referências. Afinal de contas, sempre soubera que esse seria um obstáculo
provável. É a minha primeira vez procurando uma posição, senhora. Primeira vez
usando um nome falso, primeira vez viajando para fora de Devonshire, primeira
vez sozinha..., muitas primeiras vezes, sra. Pendergast, se pudesse imaginar...
As sobrancelhas da sra. Pendergast arquearam-se numa expressão desconfiada. Ela
pôs o papel escrito cuidadosamente por Maura sobre a mesa e deu-lhe um olhar intransigente.
Eu não tenho tempo para jogos, srta. Caulfield. O nome falso soava..., bem...,
falso para Maura, que passara a vida inteira sendo a srta. Harding. A sra.
Pendergast poderia saber? O nome soaria falso para ela? Ela desconfiava? A sra.
Pendergast levantou-se para indicar que a entrevista estava terminada. Estou
muito ocupada. Tenho a certeza de que não deixou de notar a sala de espera
repleta de jovens ladies com referências, todas ansiosas para trabalhar em residências
familiares. Sugiro que tente a sorte em algum outro lugar. Isso era um
desastre. Maura não podia ir embora de lá sem uma posição. Para onde mais iria?
Não conhecia mais nenhuma agência de empregos. Sabia sobre esta somente porque a
sua preceptora a mencionara uma vez. Maura pensou rápido. Eu tenho algo melhor
do que referências, senhora. Tenho habilidades. Maura gesticulou em direcção ao
papel descartado. Sei bordar muito bem, sei cantar, dançar e falar francês. Sei
até mesmo pintar aguarelas». In Bronwyn Scott, Os Pecados de Uma Dama,
2012, Nikki Poppen, Editora HR, Harlequin, 2013,
ISBN 978-853-980-924-0.
Cortesia de EHR/Harlequin/JDACT