«Para além da existência de dispositivos formais e de práticas
informais inerentes às lógicas de organização do poder e em particular, do
poder senhorial, os duques de Bragança também promoveram, desde a sua origem,
um conjunto de estratégias conscientes que direccionavam as acções da Casa. A
análise dos empreendimentos construtivos desenvolvida pelos duques enquanto
mecenas é muito relevante, na medida em que agregava condições para atrair à corte calipolense um conjunto
muito significativo de agentes criativos, nomeadamente músicos, pintores,
escultores e diplomatas. O desenvolvimento desta vida cortesã com pompa e
grandiosidade, revela que a dimensão de residência política tinha uma
influência decisiva nos hábitos de afirmação cultural da Casa de Bragança,
através da sua inestimável corte de província.
Esta estrutura arquitectónica, enquanto espaço simbólico do sistema de
dominação política, era igualmente um lugar de organização de relações de
poder. A estruturação e a reprodução dessas relações implicava a existência de
um conjunto de regras, de normas e de procedimentos que definiam o
enquadramento formal do exercício do poder senhorial. O que também importa
ressalvar é que de entre todos os viajantes ilustres que estiveram nesta
localidade através dos séculos, nenhum, certamente veio de região mais longínqua
e exótica do que os quatro fidalgos de Kyushu.
Recordamos o facto deste local ter sido visitado por várias comitivas e
embaixadas, ao longo do tempo, o que nos revela, mais uma vez, que o Paço dos
Duques em Vila Viçosa era de facto um importante centro político, social e cultural,
como iremos também frisar ao longo desta análise. O Paço tornara-se um lugar de
tanto prestígio que acolhe personalidades como o cardeal Alexandrino, legado do
papa Pio V (1571), o vice-rei
cardeal Alberto de Áustria (1584),
os membros da 1ª embaixada japonesa a visitar uma corte europeia (1584), ou o duque Rainúncio de Parma (1601), visitas estas de que nos
deixaram relatos circunstanciados os cronistas calipolenses, caso de Lobo Vogado
(1603), Morais Sardinha (1618), Diogo Ferreira Figueroa (1633) e António de Oliveira Cardonega
(1683).
À semelhança do que aconteceu noutras cidades, também em Vila Viçosa se
gerou um clima de grande curiosidade em torno desta visita. Este processo de
aculturação, bem visível nos relatos que chegaram até aos nossos dias e que nos
falam do interesse dos japoneses pela língua e cultura portuguesas, pela caça e
gastronomia, pela música e pelas artes decorativas, também revela o fascínio
pela indumentária e pelos rituais dos japoneses. Salientamos que a precoce
idade de todos os intervenientes, o duque e os seus irmãos teriam sensivelmente
a mesma idade dos embaixadores japoneses, compreendida entre os 12 e os 15 anos,
o que certamente terá sido propiciador de um relacionamento menos formal e mais
próximo, bem visível no episódio da caçada na Tapada ducal e no passeio dado no
interior do Paço, por Duarte, um dos irmãos do duque Teodósio II com o hitatare, um robe típico dos
samurais, e hakanu, calças
japonesas, por ordem da duquesa D. Catarina e presenciado, na sua fase final,
pelos curiosos elementos da Corte Brigantina». In Tiago Salgueiro, Do Japão para
o Alentejo, A Embaixada Tenshö em Vila Viçosa no ano de 1584, A Jornada
Espiritual dos 4 samurais japoneses na Callipole de quinhentos…, Chiado
Editora, 2012, ISBN 978-989-697-670-5.
Cortesia de Chiado E./JDACT