NOTA: Conforme o original
(Continuação)
A América Antecolombiana
«Magalhães respondeu-lhe
nobremente, como homem que nada receia pelos seus actos, e que possuía o valor
necessário para fazer manter a disciplina na armada que lhe haviam confiado. Chegando
ao Cabo de Santa Maria, que João de Lisboa descobriu em 1514, foram tomar agua e lenha no rio de S. João, e ahi se
revoltaram os dois capitães João de Cartagena e Luiz de Mendoça. O plano era
matarem o capitão-mór, tomarem o dinheiro e fazenda, que sonegariam, e voltando
para Hespanha accusarem Magalhães de os levar vendidos e enganados. O
capitão-mór, que estava de prevenção, tomou logo medidas repressivas, mandando
o meirinho Ambrósio Fernandes, acompanhado de seis homens escolhidos, os quaes
com artimanhas lograram entrar no navio de Luiz de Mendoça, a quem subitamente
deram a voz de preso, e pela sua resistência o degolou o dito Ambresio.
Magalhães veiu preste em soccorro dos seus, a bordo mandou enforcar nas vergas
seis homens que se haviam tornado mais salientes, e deu o commando do navio a seu
cunhado Duarte Barboza, portuguez. A nau de Cartagena, solta do ferro, foi abalroar
com a do capitão-mór, donde resultou ser preso o chefe da revolta, João de Cartagena,
mandado esquartejar com pregão de traidor, e os seus cúmplices encarcerados nas
bombas. A nau foi entregue a Álvaro de Mesquita que havia sido contrario ao alevanlamento.
Supplantada a conspiração
e concertados os navios, seguiu avante deixando desterrados nas margens do rio alguns
dos revoltosos e navegou ao longo da costa até ao rio, a que poz o nome de Victoria,
donde lhe desertou a nau de Álvaro de Mesquita. Magalhães com os tres navios restantes
caminhou pelo rio mais de cem léguas até sahir ao mar largo, onde, com o
levante á popa, andou mais de cinco mezes, indo ter a umas ilhas, sendo uma d'ellas
povoada de selvagens com quem ligou trato de amizade, ajudando-os a desbaratar um
rei vizinho que os guerreava e fazendo troca de objectos insignificantes por oiro.
Passados alguns dias, o rei vencido fez particularmente propostas ao rei vencedor
e combinaram que este ultimo convidasse os chefes christãos a um grande
banquete onde seriam todos mortos. Fernando de Magalhães com trinta dos principaes
tripulantes cahiu na cilada e ahi foram todos traçoeiramente trucidados. Os que
ficaram nas naus, sabedores do morticínio, e sem poderem soccorrer nem vingar as
victimas deitaram fogo a um dos navios, que fazia muita agua e navegaram para o
largo. Um tal Carvalhinho, piloto da capitania foi arvorado por comandante das duas
naus, resto das cinco de que se compunha a expedição e foram parar a Borneo donde
passaram a Moluco e a Ternate. Ahi João de la Rosa substituiu no mando o Carvalhinho,
e depois de muitas contrariedades conseguiu chegar com uma das naus a Hespanha,
em 1521, com treze homens de tripulação
(Na companhia de Magalhães foi como piloto João Rodrigues Carvalho que provavelmente
é aqui designado por Carvalhinho. Gaspar Correia diz ser portuguez João de la Rosa).
Os contractos dos reis de
Castella com Fernando de Magalhães e o bacharel Ruy Faleiro, são datados de março
de 1518, e existe delles copia
authentica d'aquella epocha no archivo da Torre do Tombo. Depois do
descobrimento da America por Christovam Colombo e a instancias suas pediu a Hespanha
ao papa outra demarcação de limites que lhe garantisse as novas possessões, e Alexandre
VI, pela bulla de 4 de maio de 1493
determinou para direito de
descoberta uma linha imaginaria que partia das ilhas dos Açores e Cabo Verde, dividindo
o globo de norte a sul em partes eguaes, ficando pertencendo a de leste a Portugal
e de oeste á Hespanha…
- Omnes insulas et terras firmes inventas et inveniendas, detectas et detegendas versus occidentem et merediem, fabricando et constituendo unam lineam a polo árctico ad polum antarcticum, quae linea distet a qualibet insularum quae vulgariter nuncupantur de los Azores et Cabo Verde centum leucis versus occidentem et meridiem…
O papa era o juiz supremo dos estados christãos e raras vezes deixava de
se acatar a sua auctoridade, comtudo D. João II protestou contra a partilha, não se
conformando com a direcção da nova linha divisória, e esta oposição deu origem ao
celebre tratado de Tordezilhas, assignado em 7 de junho de de 1494, onde ficou assente entre as duas coroas
que a linha divisória passaria a trezentas legoas ao poente do archipelago de Cabo
Verde, e por isso ficou pertencendo a Portugal a parte comprehendida na futura descoberta
do Brazil». In A. C. Teixeira de Aragão, Breve Notícia sobre o Descobrimento da
América, Mckew Parr Collection, Maggellan, BrandeisUniversity (Lo que nos
importa), Tipografia da Academia Real das Ciências, Lisboa, 1892.
continua
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Ciências/JDACT