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A Montagem de uma Conspiração. Debates de Comando e Direcção
«(…) As notabilidades de Lisboa, divergentes e inactivas, não aceitavam
com facilidade a autoridade de Ribeiro Saraiva. A JN procurava gerir, com
moderação, a ambiguidade de liderança existente. Contudo, este cenário não era
o mais indicado para um plano coordenado e unitário de actuação. O problema
residia, desde logo, em definir os seus próprios contornos. A ausência de uma
chefia efectiva repercutia-se, como era inevitável, na questão decisiva do
comando militar.
Chefia(s) militar(es)
Para a definição de uma estrutura militar destinada a promover a Restauração
não era possível, desde logo, contar com os antigos generais miguelistas, pois
faltar-lhes-ia vontade e crédito nos povos. A falta de chefias militares que,
com prestígio, risco e entusiasmo, organizassem o dispositivo insurreccional
marcará, dramaticamente, esta tentativa de Restauração miguelista. Os altos
comandos do antigo exército de Miguel tinham ficado ou desacreditados (S.
Lourenço), ou ressentidos (Santa Marta) ou não acreditavam na solução das
armas, manifestando uma fidelidad e cada vez mais difusa (Póvoas). É esta
situação, quase paradoxal, que ditará o processo que culminará com a vinda do
general Macdonell em 1846. O que se trata de prover nesta fase inicial é um
recenseamento dos recursos militares disponíveis. Em primeiro lugar a
preocupação é sondar as influências locais, de forma a estabelecer a ligação
com os antigos quadros do exército realista. Daí a necessidade da existência de
um chefe militar em cada província para que tais procedimentos preparatórios tenham
sequência e organizaçãoes.
Contudo, a elaboração de um plano militar e a marcha dos respectivos
preparativos de execução dependia da existência de um Comando em Chefe que
definisse os seus contornos e prioridades, supervisionando o seu andamento. A
escolha no seio do Portugal miguelista afigurava-se em função do que atrás foi
referido, muito difícil. O único general realista que tinha credibilidade e
prestígio firmado para se colocar à frente da Restauração era o general Póvoas
(Álvaro Xavier Fonseca Coutinho Póvoa, 1773-1852, depois de ter aderido à
revolução liberal de 1820, sendo deputado nas constituintes, acaba por
ingressar na chamada contra-revolução. Não só apoia a Vila Francada, 1823, como
também se integra no regime de Miguel, onde ocupa diversas posições de chefia
militar, a última das quais a de comandante em chefe do Exército realista em
1833). Como veremos, não deixarâ de ser sondado, mas as suas hesitações
mostravam claramente que o seu envolvimento era duvidoso. Na verdade, a sua
inclinação ia para a corrente eleitoral miguelista o que, convenhamos, não
denotava um excesso de entusiasmo pela solução armada.
Talvez tendo em conta estes condicionalismos, os mentores da conspiração
miguelista apresentaram desde logo, em 1842, a proposta de ser o general
Macdonell o chefe militar da Restauração. Esta solução tem em conta dois
factores decisivos: o prestígio de Macdonell em Portugal e a ausência de uma
alternativa imediata e convincente. Anteriormente, ao que supomos em 184l, dom
Miguel, na altura em que nomeou os chefes miguelistas de Lisboa, havia indicado
um general em chefe, cujo nome não conseguimos apurar. Trataram-se de nomeações
sem grande eficácia prática. O que estava em causa, na época, era sobretudo
salvaguardar a fidelidade das notabilidades realistas e não propriamente a
definição imediata de um plano de operações». In José Brissos, A Insurreição
Miguelista nas Resistências a Costa Cabral (1842-1847), Faculdades de Letras de
Lisboa, Edições Colibri, 1997, ISBN 972-8288-80-8.
Cortesia de Colibri/JDACT