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‘A
parte do diário dedicada a S. Salvador de Aramenha, que motiva estas páginas,
contém a descrição das epígrafes que Cornide viu na chamada "Quinta do
Deão" ou "Horta do Deão", que sabemos, pelo diário, que é a «horta
e casa do deão de Portalegre e outras terras de sua pertença. Transcrevemos integralmente
esta parte do diário’
«Daí
segui eu para Marvaom [Marvão], que, em linha recta, apenas distará meia légua,
mas leva mais de hora e meia; esta pequena praça está assentada, como disse, no
ponto mais elevado da serra do norte, sobre uma massa de pedra escarpada larga
e estreita; a fortificação é irregular mas um tudo-nada moderna; da parte do
poente tem o castelo, reforçado ultimamente com alguns baluartes; há nele una
cisterna e, na parte exterior, em direcção à vila, outra muito capaz e bem
edificada e de que dizem que pode dar água para a guarnição por mais de seis
meses. A vila, que constará de uns 150 fogos, situa-se na parte oriental do
castelo e as suas casas são de pouca monta; tem duas paróquias, uma antiga e
outra mais moderna; vi junto a esta cinco ou seis colunas de mármore que me
disseram terem sido trazidas das ruínas de Arameña [Aramenha], a qual, assim
como outras duas ou três paróquias, pertence ao termo de Marvaom [Marvão].
Para
subir a este castelo há dois caminhos, que, apesar da aspereza do cerro, são
bastante suaves, pois se formaram vários giros e ziguezagues; começam no Sever,
à saída de uma ponte de pedra que tem, do lado de Arameña [Aramenha], uma torre
quadrada para lhe defender o acesso. Os dois caminhos, gira um pela parte
oriental e outro pela ocidental e entram na vila pelas duas portas que dão para
esses pontos; a oriente, e um tudo-nada mais abaixo da vila e das suas obras
exteriores, há um convento de Capuchos.
Fica
compensada a vida dos de Marvaom [Marvão], como que numa região aérea e
separados do trato com os mais homens, por gozarem de permanente saúde e
atingirem avançada idade, desfrutando das necessárias comodidades da vida, de
que os provê o seu dilatado termo, abundante em frutas e carnes de porco e de ovelha,
ambas de excelente gosto.
Quando
cheguei ao ponto mais alto do castelo, tive a sensação de me encontrar elevado
num balão: sob os meus pés, um extenso país, especialmente para oriente, norte
e poente; reconheci, a olho nu, San Vicente, Valencia de Alcántara, El Carvajo
[e] Herrera em Espanha, Montalbán [Montalvão] e Castelo de Vide em Portugal e,
no tortuoso curso do Sever, a raia que separa os dois reinos até à sua
confluência com o Tejo.
Todos
estes terrenos inferiores, ainda que pareçam planos se se comparam com a
elevação deste castelo, são, na realidade, mui escabrosos e ásperos, mas não
deixam, por isso, de produzir excelentes plantas, algum centeio e, nas
azinhagas, frondosos castanheiros, que, tal como as azinheiras e os sobreiros,
são as árvores mais comuns e mais úteis da região; esta a defende a referida
praça, que, pelas já aludidas circunstâncias, eu a contemplo como sendo a mais
forte de Portugal, embora, para a defesa geral do reino, eu não saiba que
utilidade possa ter a sua manutenção, pois é fácil evitá-la em qualquer entrada».
In Juan Manuel Abascal, Universidad de Alicante, Rosario Cebrián, Parque
Arqueológico de Segóbriga, José d’Encarnação, Universidade de Coimbra, Marvão e
Ammaia ao tempo das Guerras Peninsulares, IBN MARUAN, 2009, Edições Colibri,
Câmara Municipal de Marvão, ISBN 978-972-772-876-3.
continua
Cortesia
de E. Colibri/CM de Marvão/JDACT