domingo, 4 de novembro de 2012

Portugal e a Universidade de Salamanca. Participação dos escolares lusos no governo do Estudo, 1503 a 1512. Armando Marques. «Ora, não sucede o mesmo, felizmente, com os livros de Claustros, cuja série mais ou menos completa só começa em 1526, mas de que se conservam dois preciosos núcleos antes dessa data»


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«Enfim, não menos que o número, não menos que este espírito de corpo, outra coisa tornava a colónia portuguesa respeitada naquela década de 1503-1512: o fulgor académico de alguns compatriotas nossos, daqueles especialmente que desempenharam o ofício de conselheiros do Estudo ou subiram às cátedras da Alma Mater.
Como se havia de desconhecer, por exemplo, Aires Barbosa, o primeiro helenista do seu tempo na Península, fundador dos estudos gregos como Nebrija o fora dos latinos?
Donde nos veio a ideia de estudar a presença de Portugal na Universidade de Salamanca e porquê a escolha desse decénio de vida escolar compreendido entre 1503 e 1512?
Tudo começou com a necessidade de esclarecer alguns pontos relacionados com a tese de doutoramento sobre o humanista português Frei Sebastião Toscano, o qual frequentou lá os gerais de Leis, antes de tomar o hábito no vizinho convento de San Agustín. De facto, no contacto com os papéis do Arquivo Universitário, outro projecto de investigação imediatamente nos seduziu: publicar alguns dados documentais lá existentes sobre os estudantes lusitanos que passaram pelo Estudo. Daí, um primeiro trabalho Portugueses nos ‘Claustros’ salmantinos do século XV, que viu a luz da publicidade na ‘Revista Portuguesa de Filosofía’. Daí, que, por ser até certo ponto homólogo daquele, se poderia intitular Portugueses nos ‘Claustros’ salmantinos do século XVI.
Esclareçamos que a palavra Claustros se refere aos livros de claustros, ou seja, as actas dos conselhos escolares, além de outros termos e assentos que se lançavam lá. Assim, a pergunta surge espontânea, pertinente: porquê a escolha desta espécie de livros?
A pergunta, insiste-se, é pertinente. De facto, toda e qualquer investigação sobre estudantes portugueses na Universidade de Salamanca parece devia começar pelos livros de Matrículas, onde os nossos compatriotas surgem em catadupa. A pesquisa devia continuar com os livros de Graus, onde se regista a lista ainda grande, embora já menor, dos que se bacharelavam ou faziam prova dos seus cursos. Só então viriam os livros de Claustros. E viriam só então porque, sendo constituídos fundamentalmente pelas actas dos conselhos escolares (além dos tais outros termos e assentos que se lançavam lá), os estudantes só podem figurar neles per accidens: como testemunhas, ao sabor da revalidação de algum curso, etc.
Simplesmente, os livros de Matrículas começam no ano lectivo de 1546-1547. Há, logo depois, um hiato. E só a partir de 1551-1552 está a série praticamente completa.
Quanto aos livros de Graus, principiam em 1526-1527. Há depois, e também, um hiato até 1531-1532. E só a partir daí prosseguem sem interrupção.
Ora, não sucede o mesmo, felizmente, com os livros de Claustros, cuja série mais ou menos completa só começa em 1526, mas de que se conservam dois preciosos núcleos antes dessa data:
  • os livros 1,2 e 3, que contemplam o período de 1464-148l,
  • os livros 4, 5 e 6, que abarcam os anos de 1503-1512.
O trabalho publicado na ‘Revista Portuguesa de Filosofia’, incidiu sobre o primeiro núcleo, revelando-nos uma lista inteiramente inédita de trinta compatriotas nossos, em que avulta a figura egrégia de Rodrigo Álvares,  chantre da catedral e, além disso, conselheiro, deputado e reitor da Universidade; o trabalho debruça-se sobre o segundo núcleo, fornecendo-nos uma lista não menos nutrida e valiosa. Revertendo, pois, à pergunta: que razões levaram a escolher esta classe de livros, os mais sáfaros de todos?
As razões foram três:
  • porque cobrem uma época de que falta toda a documentação referente à vida da Universidade;
  • porque, dada a dificuldade da letra, têm sido pouco consultados e quase sempre de forma ocasional;
  • porque os últimos decénios do século XV e os primeiros do século XVI são também o período, tão pouco conhecido ainda, da introdução do Humanismo em Espanha e Portugal».
In Armando J. Marques, Portugal e a Universidade de Salamanca, Participação dos escolares lusos no governo do Estudo, 1503 a 1512, ediciones Universidad de Salamanca, Prémio de História Calouste Gulbenkian, História da Presença Portuguesa no Mundo, 1978, Salamanca, 1980.

continua
Cortesia da Universidade de Salamanca/JDACT