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A polémica dos exames
«Os exames, como todos os processos de avaliação e divulgação da avaliação, constituíram um dos tópicos de mais aceso debate dos últimos anos. A polémica reacendeu-se em 2003, em torno da decisão do Ministro … de instituir exames finais a Matemática e Português no 9º ano de escolaridade, rompendo com a prática de muitos anos de deixar os estudantes concluírem todo o ensino obrigatório sem um único exame nacional. A Ministra do mesmo partido que lhe sucedeu, …, decidiu avançar com esses exames, atribuindo-lhes apenas a ponderação de 25% na nota final dos alunos, com a restante parcela da nota a ser determinada pela avaliação feita pela escola.
Como foi destacado pela imprensa diária, a Sociedade Portuguesa de Matemática foi a única agremiação que na altura se pronunciou publicamente a favor da realização dos exames, as associações de professores, os sindicatos e as associações de pais pronunciaram-se contra esta decisão. Pouco depois, quando o governo do … caiu, muitos reacenderam as esperanças de que esses exames seriam anulados. Mas em Abril de 2005, a Ministra da Educação e o Primeiro-Ministro do então recente governo do … tornaram claro que iriam manter a decisão do anterior governo.
Este enquadramento é necessário para perceber que os exames de 2005, devido à sua diminuta ponderação, iriam ter, como de facto tiveram, um impacto mínimo no processo escolar dos estudantes. A oposição aos exames foi pois uma oposição de princípio e ideológica, como se torna claro pela leitura das intervenções na polémica.
Alguns argumentos são tão incongruentes que é difícil considerá-los seriamente. O mais frequente tem sido o seguinte:
- - Não são os exames, e sim a qualidade de ensino, aquilo que pode garantir a aprendizagem.
O argumento tem tanto sentido como dizer que o médico não deve indicar análises clínicas aos doentes, pois não são as análises e sim os tratamentos que conduzem à cura.
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No entanto, há quem o avance:
- mais do que a avaliação sumativa externa, é o reforço da qualidade das práticas de ensino e de aprendizagem que pode garantir adequados níveis de desempenho por parte dos alunos.
Em nossa opinião, os argumentos mais coerentes dos oponentes aos exames reduzem-se a dois:
- - A reprovação não ajuda os alunos a progredir, ou seja, a retenção não se traduz mais tarde num acréscimo de conhecimentos dos alunos, pelo que falharia os seus objectivos;
- - Os exames não conseguem avaliar todas as ‘competências’ que se pretende desenvolver nos alunos, privilegiando os aspectos de memorização e mecanização, pelo que prejudicariam o desenvolvimento das ‘competências’ desejadas, que incluem a capacidade de aplicar conhecimentos, a expressão oral e o raciocínio, entre outros.
Há uma parcela de verdade nestes argumentos, mas são argumentos incompletos e tendenciosos. Em primeiro lugar, os exames estabelecem metas e, por isso, podem incentivar os alunos a lutar para ultrapassar essas metas. Nesse sentido, opõem-se à repetência. Mas mesmo que assim não fosse, o facto de a retenção não ter um efeito positivo sobre o percurso escolar do aluno significa que tem necessariamente um efeito negativo? Na realidade, os exames podem exercer uma influência positiva nos estudantes no seu conjunto, mesmo que haja excepções.
Além disso, os exames podem ser orientadores de percursos escolares, levando, por exemplo, a encaminhar estudantes com dificuldades para vias alternativas, com o mesmo ou com outro término escolar.
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Em segundo lugar, uma coisa é a listagem das insuficiências dos exames, outra a justificação do seu abandono. É essa ligação que nunca é feita pelos críticos da avaliação externa. Em terceiro lugar, é necessário considerar a realidade portuguesa, os alunos, os professores e a cultura social predominante, que se reflecte obviamente na escola. Enquanto noutras sociedades e noutras situações se podem abolir exames nacionais, que são substituídos por outros sistemas de avaliação credíveis, não necessariamente menos exigentes, em Portugal e em 2005 parecem ser imprescindíveis “juízes de fora”, ou seja, sistemas de avaliação externos à escola.
Finalmente, os exames podem ser bem feitos ou mal feitos. Podem privilegiar a memorização ou podem privilegiar o raciocínio. Podem dirigir-se à solução mecânica de exercícios ou podem dirigir-se à aplicação criativa de técnicas e conceitos. Ideia semelhante foi expressa a certa altura pelo então Ministro … :
- Fico relativamente surpreso quando se diz que um ensino assente em competências não é susceptível de ter avaliação externa [...]. A chamada avaliação externa tanto avalia competências como avalia conhecimentos, tudo depende de se saber como se faz a avaliação.
Concordamos, em geral, com este argumento, mas pensamos que a actual apresentação da noção de competências, bem como as suas formulações vagas, confusas e contraditórias, nem sempre permitem uma avaliação objectiva. Por vezes, as ‘competências’ são tão vazias que não podem ser avaliadas, mas também nesse caso não podem servir para orientar o estudo. Ou seja, indo mais longe pode pôr-se em causa a própria nova teoria e prática das competências». In Nuno Crato, O “Eduquês” em Discurso Directo, Uma Crítica da Pedagogia Romântica e Construtivista, Gradiva 2006, ISBN 978-989-616-094-4.
Continua
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