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A
Salamandra de Lisieux
«(…)
Pequena cidade normanda, que deve às suas numerosas casas de madeira, às suas
empenas de sacada, o pitoresco aspecto medieval que todos lhe conhecemos, Lisieux,
respeitadora do seu passado, oferece-nos, entre outras curiosidades, uma bonita
e muito interessante moradia de alquimista. Casa rnodesta na verdade, mas que
prova no ssu autor a preocupação de humildade que os felizes beneficiários do
tesouro hermético faziarn voto de respeitar durante a vida inteira. É
geralmente designada pelo nome de Solar
da Salamandra, e ocupa o número 19 da rue
aux Fèvres. A despoito das nossas pesqnrúsas foi-nos impossível obter a mínima
informação acerca dos seus primeiros proprietários. Não são conhecidos. Ninguém
sabe, em Lisieux ou noutro lado, por quem foi construída no século XVI, nem
quais foram os artistas que a decoraram. Para não faltar à tradição, sem
dúvida, a Salamandra guarda
ciosamente o seu segredo e o do alquimista. No entanto, foi objecto duma notícia,
mas essa limita-se à descrição pura e simples dos assuntos esculrpidos que o turista
pode admirar na fachada. Esta notícia e algumas linhas inseridas na Statistique
monumentale du Calvados, de De Caumont (Lisieux, tomo V), representam
tudo quanto apareceu sobre o Solar da
Salamandra. É pouco, e lamentamo-lo. Porque o minúsculo mas delicioso
edifício, construído pela vontade dum verdadeiro adepto, decorado com
motivos extraídos do simbolisrno herrnético da alegoria tradicional, merece
mais. Bem conhecido dos Lexovianos, é ignorado pelo grande público, talvez
mesmo por muitos dos amadores de arte, embora a sua decoração, tanto pela sua
abundância e variedade como pela sua bela conservação, autorize a classificá-lo
na primeíra fila dos melhores edifícios do género. É uma lamentável lacuna, e
tentaremos preenchê-la, sublinhando ao mesmo tempo o valor artístico dessa
elegante moradia e o ensino iniciático que ressalta das suas esculturas.
O
estudo dos motivos da fachada permite-nos afirmar, com a convicção nascida duma
análise paciente, que o construtor do Solar foi um alquimista instruído, que
nele deu a medida do seu talento; noutros termos, um adepto possessor da
pedra filosofal. Certificamos igualmente que a sua afiliação a algum centro
esotérirco, com numerosos pontos de contacto com a ondem dispersa dos
Templários, se revela indiscutível. Mas qual podia ser essa fraternidade
secreta que se honrava por contar no
número dos seus membros o sábio filósofo de Lisieux? Somos forçados a
confessar a nossa ignorância e a deixar a questão em suspenso. Contudo, e
embora tenhamos pela hipótese uma invencível repugnância, a verosimilhança, a
relação das datas e a proximidade dos lugares sugerem-nos certas conjecturas, que
vamos expor a título de inclicação e com todas as reservas.
Cerca
de um século antes da construção do Solar
de Lisieux, três companheiros alquimistas laboravam em Flers (Orne) e ali realizavam a Grande Obra, no ano de
1420. Eram eles Nicolau de
Grosparmy, gentil-homem, Nicolau ou Noël Valois, também
chamado Le Vallois, e um padre de nome Pedro ou Vitecoq. Este
último qualifica-se a si mesmo como capelão
e servidor doméstico do senhor de Grosparmy. Dos três, só De Grosrparmy
possuía alguma fortuna, com o título de Senhor e o de conde de Flers. Foi
contudo Valois o que primeiro descobriu a prática da Obra e a ensinou aos seus
companheiros, tal como o dá a entender nos seus Cinco Livros. Tinha então
quarenta e cinco anos, o qüe dá 1375
como data do seu nascimento. Os três adeptos escreveram dìferentes
obras, entre os anos 1440 e 1450. Nenhum desses livros, aliás,
foi jamais impresso. Segundo uma nota anexa ao rnanuscrito n.º 158 (125) da
Biblioteea de Rennes, teria sido um gentil-homem normando, Bois Jeuffroy,
quem herdara todos os tratados originais de Nicolau de Grosparmy, Valois e
Vicot. Deles vendeu uma cópia completa ao defunto
senhor conde de Flers, mediante 1500 libras e um cavalo de preço. Este
conde de Flers e barão de Tracy é Luís de Pellevé, falecido em 1660, que era bisneto, por parte das
mulheres, do autor Grosparmy». In Fulcanelli, 1930, Les Demeures
Philosophales, 1965, As Mansões Filosofais, colecção Esfinge, Edições 70,
Lisboa, 1977.
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