domingo, 21 de setembro de 2014

LX 60. A Vida em Lisboa Nunca Mais Foi a Mesma. Joana Vilela e Nick Mrozowski. «Na década de 60, a capital e os municípios da área metropolitana (incluindo margem sul) ultrapassam o milhão de habitantes. O negócio da construção civil arranca, irá ‘explodir’ entre os anos 70 e 90»

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Portugal, 1960. Instantâneos
«Mais de 82% dos partos ocorrem em casa, morrem 7,7 crianças por cada 100 nascimentos; 8,9 milhões de residentes, 92% com menos de 65 anos; esperança de vida, homens 60,7 anos, mulheres 66,4 anos; mais de 65% das pessoas com 15 ou mais anos nunca foram à escola, população com instrução equivalente ao ensino superior 1%; apenas 9,3% dos casamentos não são católicos, 1 em cada 100 acaba em divórcio; 80médicos e 108 enfermeiros por 100 mil habitantes; existem 203 diários e semanários, num total de 468 publicações periódicas».

A Idade do Ouro
«Idade do Ouro não será a primeira ideia que a maioria das pessoas associa aos anos 60 em Lisboa, ou em Portugal. Mas, na história da economia portuguesa, a década de 60 é um marco incontornável: regista-se o maior crescimento económico de sempre e lançam-se sementes para transformações posteriores. O impacto relativo é maior no interior isolado e rural, mas para Lisboa a expansão traz novidades, da modernização da cidade (com a ponte sobre o Tejo e novas urbanizações, como os Olivais), ao aumento das possibilidades de consumo (embora ainda muito longe do que se tornará realidade 50 anos depois). Dos acontecimentos que marcam a década de 60, e que explicam que a economia tenha praticamente triplicado entre 1958 e o início dos anos 70, a entrada na EFTA a 4 de Janeiro de 1960 lidera. Criada para rivalizar com a Comunidade Económica Europeia (CEE), a EFTA (Associação Europeia de Comércio Livre) começa com sete países. Seis são desenvolvidos: Noruega, Dinamarca, Áustria, Reino Unido, Suíça e Suécia. O sétimo é pobre e rural: Portugal.
A excepção portuguesa, que não pode entrar na CEE por não ter um regime democrático e ser demasiado pobre para ser integrada com as restantes economias, consegue um acordo especial, que preserva barreiras alfandegárias de defesa da indústria nascente, ao mesmo tempo que abre as portas a mercados de exportação mais ricos e exigentes. A emigração, para fugir à pobreza rural ou à Guerra Colonial, que se acentua também nos anos 60, é outra força importante. O milhão de portugueses que em dez anos saem do país consegue uma taxa de poupança altíssima, em alguns casos documentados em França ronda 50% do rendimento, que envia como remessas para Portugal. Os bancos expandem-se para o interior, com balcões e agentes, para captar esse dinheiro que acaba por formar uma importante base de capital. Um empréstimo para um projecto empresarial a 35 anos a uma taxa de apenas 3% é uma realidade possível na década de 60.
Dinheiro barato e abertura económica ao exterior levam ao nascimento de novas indústrias, como a fábrica da Toddy em 1960, em Belas ou, noutra escala, a Siderurgia Nacional, em 1961, no Seixal. As mudanças desenvolvem também velhos gigantes, como a CUF. A Companhia União Fabril já empregava 16 mil pessoas nos anos 30, mas chega ao final da década de 60 como o maior conglomerado industrial português (químico, têxteis, indústria naval e alimentar, tabacos, entre outros), sediado na margem sul do Tejo, a poucos minutos de Lisboa (Barreiro). Observado no papel, o desenvolvimento significa crescimentos anuais da economia acima de7%, um ritmo muito distante da média próxima de zero que Portugal registará na primeira década do século XXI. O país rural começa a desaparecer. Em 1958, a agricultura ocupa 43% da população; no início dos anos 70, já só vale 34%. O declínio face à expansão industrial e dos serviços leva não só à emigração mas também à migração para as cidades no litoral, como Lisboa.
Na década de 60, a capital e os municípios da área metropolitana (incluindo margem sul) ultrapassam o milhão de habitantes. O negócio da construção civil arranca, irá explodir entre os anos 70 e 90, e aumenta a urbanização das zonas rurais à volta da cidade. Nesta zona privilegiada [...] disporão os seus habitantes de todas as instalações públicas indispensáveis para a vida moderna, lê-se num anúncio a 19 de Novembro de 1964, no Diário de Lisboa, sobre a cidade jardim da Reboleira». In Joana Stichini Vilela e Nick Mrozowski, LX 60, A Vida em Lisboa Nunca Mais Foi a Mesma, Publicações Dom Quixote, Alfragide, 2012, ISBN 978-972-20-5091-3.

Cortesia D.Quixote/JDACT