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e wikipedia
«… Na feitura desta
reunião de dados, consultei algumas dezenas de publicações. Seria fastidioso e
desnecessário enumerá-las exaustivamente. Para o leitor vulgar, tornar-se-ia
desinteressante tal lista; para o especialista nada traria de novo. Todavia,
sempre que achei necessário, citei, nos próprios verbetes, os autores e as
obras em que me baseei.
Abade
Sabe
que abade significa pai? Se assume esta palavra, presta um serviço ao Estado.
Desempenhará o melhor papel que um homem pode desempenhar: nascerá de si um ser
pensante. Nisso há qualquer coisa de divino. Mas se você é abade só porque quis
ser tonsurado, quis usar um colarinho branco, uma capinha e auferir um
rendimento fixo, você não merece o título de abade. Os antigos monges davam
esse nome ao superior que elegiam. O abade era o seu pai espiritual. Como o
mesmo título significa coisas diferentes com o passar do tempo! O abade
espiritual era um pobre à frente de outros pobres, mas os pobres abades, mais
tarde, já tinham 200, 400 mil libras de renda e hoje há pobres pais espirituais
que têm um regimento de guardas por sua conta. Um pobre, que fez juramento de
ser pobre e que, afinal, é um rei! Já se disse isto, frequentemente, mas é
preciso dizê-lo mais vezes, porque é intolerável. [... ] Estou daqui a ouvir os
senhores abades de Itália, da Alemanha, da Flandres, da Borgonha, a dizerem:
porque é que não temos o direito de acumular bens e honrarias? Porque não
podemos ser príncipes? Os bispos são-no; originariamente, eram pobres como nós,
enriqueceram, ascenderam aos mais altos postos, um deles até se tornou soberano
dos reis, deixem-nos imitá-los. Têm razão, senhores, invadam a terra. Ela
pertence ao forte e ao hábil que dela se apodere. Vós tendes aproveitado tempos
de ignorância, de superstição, de demência para nos despojarem do que herdámos,
para nos espezinharem, para engordarem com a carne dos infelizes. Tremam quando
o dia da razão chegar.
Estas
palavras de Voltaire definem o estado a que chegara o título de abade, poucos
anos antes da Revolução Francesa. Era cognome e cargo dado a torto e a direito,
autêntica sinecura, todos os eclesiásticos, com ordens ou sem ordens (e mesmo
os leigos) podiam receber a distinção e o proveito ainda que não pertencessem a
qualquer abadia (chamava-se a estes, entre outros designativos, abades sem
abadia, abades cortesãos ou abades da Santa Esperança de algum dia virem a ter
abadia). Verdadeiros peralvilhos, inúteis, ociosos, frequentadores das senhoras
da nobreza, passeavam o seu estatuto pelos salões (recorde-se o célebre abade
Prevost, escritor de mérito, autor, por exemplo, de Manon Lescaut). Daí a
indignação de Voltaire. Porque a palavra abade é profana. Foram os cristãos
gregos que a introduziram na religião, chamando aos primeiros superiores dos monges
abbot, o que, na língua síria, significava pai. Origem contestada, no
entanto, pelos que dizem ser a palavra hebraica, aba (com o sentido de
amar, querer bem e daí também pai). Antes dessa passagem para a linguagem
religiosa, a palavra era atribuída àquele que, pela idade, sabedoria e pureza
de alma, aconselhava, orientava os que se lhe dirigiam. Cristo invocando Deus,
em Getsémani, diz Abbá. S. Paulo nas epístolas aos Romanos e aos Gálatas,
utiliza também Abbá. Os judeus no livro dos Apótegmas incluem um capítulo
chamado Pirke abbot, ou seja, Capítulo dos pais. Jesus Cristo
terá proibido os seus discípulos, por tal razão, de chamarem pai a qualquer
homem, visto que pai no sentido místico só seria Deus. E S. Jerónimo proibiu,
igualmente, os monges de darem esse título àqueles que os superintendiam.
Preveria o santo o que acontecia nos tempos de Voltaire? A verdade é que as
palavras do filósofo estão bem presentes ainda na nossa linguagem popular em
expressões como: cara de abade, dormir como um abade, comer como um abade.
Abalar
Pode
significar partir com pressa, ir-se embora ou abanar, oscilar,
fazer tremer, sentidos que só por generalização se ligam à origem da
palavra. Proveniente do verbo latino advallare,
por sua vez, vindo de vallis (vale)
é, literalmente, descer para o vale, ir para baixo». In Orlando
Neves, Dicionário da Origem das Palavras, 2001, Editorial Notícias, 2007, ISBN
978-972-461-187-7.
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