quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

O arranque dos Descobrimentos. Aprendizagem. Paulo Jorge Pinto. «… que a altura da estrela acima do horizonte era tanto maior quanto a distância a que o observador se encontrasse do equador, ou seja, ‘equivale a uma latitude’…»

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Como foi feita a aprendizagem da ciência náutica?
«(…) Até ao século XV, o horizonte náutico da Europa estava limitado ao Mediterrâneo, ao norte da Europa e ao sul de Marrocos. Para um piloto era suficiente, portanto, munir-se de bússola e de uma carta-portulano, isto é, uma carta / mapa onde constavam, não as coordenadas geográficas, latitude e longitude, mas sim os rumos de navegação. Como esta era feita com bússola, bastava seguir a rota traçada, consoante o porto onde se encontrasse e o de destino, calculando as milhas a percorrer na viagem; por isso se chamava navegação por rumo e estima. Como se navegava à vista de terra e nunca se passava muito tempo sem vista dela, o piloto corrigia eventuais desvios da rota com alguma facilidade. As correntes e os ventos eram conhecidos, o que minimizava o risco de acidentes e de naufrágios. O cabo Bojador marcava o limite do conhecimento náutico, ou seja, não se sabia que ventos e correntes existiriam a partir dali e não havia registos nas cartas ou informações sobre profundidades, baixios, recifes ou outros acidentes da costa. Os portugueses passaram-no sem grandes dificuldades mas, à medida que avançavam para sul, perceberam que sopravam ventos em sentido desfavorável que dificultavam o regresso. Havia, portanto, que encontrar uma solução, que acabou por ser a adaptação de um navio de origem árabe, a caravela, às necessidades práticas: dispondo de uma vela triangular, este tipo de navio permitia bolinar, ou seja, avançar mesmo que o vento não fosse favorável, manobrando em ziguezague.
Esta solução foi suficiente durante algum tempo. Mas o regresso era cada vez mais lento e difícil, uma vez que obrigava o piloto às manobras de bolina, isto é, a virar constantemente de rumo para poder avançar. A certa altura, tornou-se impraticável, já que as distâncias a percorrer eram cada vez maiores. Porque não encontrar um modo de aproveitar integralmente o vento, em vez de procurar contrariá-lo? Mas isso forçaria o navio a afastar-se da costa e a perder-se no mar alto, a menos que se encontrasse um modo de determinar com rigor a localização do navio e o rumo a tomar; no mar alto, as estrelas e o Sol eram as únicas referências possíveis, portanto, esse modo teria de guiar-se por eles: é isto a navegação astronómica, cujos primeiros passos foram dados pelos homens do infante Henrique e cujo mérito lhes cabe inteiramente a eles, marinheiros e pilotos, e não a qualquer junta de sábios estrangeiros reunida em Sagres. A navegação astronómica percorreu um longo caminho de prática e aperfeiçoamento, desde as primeiras décadas do século XV até ao século XVIII, quando o último dos problemas fundamentais, o cálculo rigoroso da longitude, foi finalmente resolvido. A orientação pelos astros não era uma coisa nova; desde há muito que se sabia que certas estrelas apontavam em determinadas direções. A Estrela Polar indica o Norte e, aos poucos, percebeu-se que a altura da estrela acima do horizonte era tanto maior quanto a distância a que o observador se encontrasse do equador, ou seja, equivale a uma latitude; a leitura de várias alturas da Polar dava latitudes distintas, cada uma delas correspondente a uma determinada região na costa africana.
Com a sistematização das informações recolhidas e com um instrumento simples, o quadrante, era possível aplicar os conhecimentos astronómicos às rotinas de navegação. Gradualmente, estes cálculos tornaram-se mais rigorosos e fiáveis, e foram encontradas várias formas de corrigir erros de leitura, por exemplo, decorrentes das variações da própria Estrela Polar consoante a hora da noite. A súmula destes conhecimentos práticos era então registada em regimentos, espécie de manuais de utilização e guias de instrução para pilotos e marinheiros. A partir de quando se pode afirmar que os Portugueses passaram a fazer navegação astronómica, ou seja, regressando a Portugal pelo largo e não junto à costa? Os dados são escassos, mas hoje é aceite sem grandes dúvidas que terá sido algures entre 1435 e 1440, segundo se depreende da comparação entre um mapa de 1436, o início da colonização dos Açores, 1439, e uma passagem da crónica de Zurara». In Paulo Jorge Sousa Pinto, Os Portugueses Descobriram a Austrália? Porque foi Conquistada Ceuta? O arranque dos Descobrimentos, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2013, ISBN 978-989-626-498-7.

Cortesia de EdosLivros/JDACT