Contexto histórico
O Estado da Índia e o Padroado Português do Oriente. Os profissionais
da arquitectura
«Com a descoberta do caminho marítimo para a Índia por Vasco da Gama, em
1497 / 1498, atingiu-se um dos mais importantes objectivos da expansão portuguesa,
que se tinha iniciado em 1415 com a conquista de Ceuta. Os portugueses tinham
chegado a um ponto decisivo da rota das especiarias e estavam assim possibilitados
de a alterar segundo as suas próprias conveniências. Isso significava desviar o
seu curso em direcção à Europa praticado até então, através da península Arábica,
do Mediterrâneo e de Veneza, fazendo-o passar por Lisboa, torneando as costas
africanas. Para isso era necessário aniquilar o comércio árabe no oceano
Índico, através do qual as especiarias eram levadas da Índia para a península Arábica
e que representava o primeiro elo da rota tradicional das especiarias. A
concorrência e agressão portuguesas em relação aos comerciantes árabes teve por
consequência uma reacção animosa por parte destes, que se viam assim privados
da sua fonte de riqueza. Para assegurar a sua supremacia, os portugueses
viram-se por seu lado obrigados a fixar-se permanentemente nas costas do oceano
Índico, e na própria Índia. Assim, o rei Manuel I ordenou a Francisco
de Almeida a edificação de fortalezas em pontos estratégicos para garantir
a defesa dos estabelecimentos e do comércio marítimo dos portugueses nesta área
do globo. A nomeação do mesmo Francisco de Almeida para vice-rei da
Índia, em 1505, representou uma
alteração decisiva na política da Coroa em relação à até então vigente, necessária
para a consolidação da presença dos portugueses no Oriente. Fundou-se assim o
Estado da Índia, ao qual viriam a pertencer até aos anos 70 do século XVI todos
os territórios a oriente do cabo da Boa Esperança sob domínio português.
Com a fundação do Estado da Índia, a Coroa portuguesa instituiu uma
administração central no Oriente, que, se por um lado dependia de Lisboa,
possuía, por outro, uma autonomia relativa. O rei era aqui representado por um
vice-rei ou governador, em regra por um período de três anos. Este estava à
frente de uma administração com modelo na da metrópole e que tinha por função
garantir a existência e a defesa do comércio marítimo, dos navios e dos
territórios portugueses, assim como das missões de cristianização no Oriente.
Numa primeira fase, os portugueses tinham-se fixado em Cochim, com autorização
do governador desta cidade, que lhes era favorável. Mas, em 1510, Afonso de Albuquerque
conquistou a cidade de Goa, uma
metrópole comercial florescente, até então sob governo islâmico, que fazia
parte do reino de Bijapur
desde 1489. A sua localização vantajosa
levou o governador Nuno da Cunha a mudar a sede do governo de Cochim
para Goa, em 1530. Com a
expansão portuguesa durante os séculos XV e XVI tornou-se necessário organizar
canonicamente a consequente expansão do cristianismo. As bulas Respublica
christiana, de 1418, e Dum
diversas, de l412,tinham concedido
aos portugueses, através da autoridade papal, os privilégios de descobrir e
conquistar territórios fora do mundo cristão e de subjugar os seus habitantes.
Para Portugal, estas bulas representavam a legitimação na Europa do domínio português
sob os territórios até então conquistados. A bula papal Romanus pontifex, de 1455, foi ainda mais longe,
reconhecendo não só o domínio português de todos os territórios até então
conquistados e a conquistar no futuro, mas também proibindo, sob pena de
excomunhão, a navegação estrangeira nestes domínios sem autorização do rei de
Portugal. O Papa concedeu ainda à
Ordem de Cristo e ao rei de Portugal privilégios no ultramar no domínio
eclesiástico comparáveis aos de um bispo, como por exemplo fundar igrejas e
mosteiros e propor a nomeação de clérigos à Santa Sé. Com esta bula
foram lançados os fundamentos do padroado real português no Oriente. Ao mesmo
tempo, era regulamentado o papel da Ordem de Cristo nos domínios
conquistados. Esta ordem tinha sido desde muito cedo envolvida no processo dos
descobrimentos, sobre tudo por ter tido como grão-mestre o infante Henrique, e
permaneceu sempre ligada à Coroa, pois o cargo de grão-mestre era
tradicionalmente atribuído a um membro da família real. Uma outra bula papal, a
Inter
caetera, de 1456, confirmou
os privilégios e direitos eclesiásticos, ou seja, de padroado, atribuídos pela Romanus
pontifex ao rei português em relação a territórios conquistados. A diferença
em relação às bulas anteriores é que agora se mencionavam limitações destes
direitos, nomeadamente em territórios que viessem a pertencer a uma diocese.
Neste caso, alguns dos direitos de padroado da Ordem de Cristo passariam para o
rei e para o respectivo bispo.
O Tratado de Tordesilhas, em
1494, entre Portugal e Espanha, com
mediação papal, regulava não só as pretensões de ambos os países ibéricos sobre
novos territórios descobertos, mas limitava também geograficamente os privilégios
e direitos do rei português». In António Nunes Pereira, A Arquitectura
Religiosa Cristã de Velha Goa, Segunda metade do Século XVI, Primeiras Décadas
do Século XVII, Orientalia, Fundação Oriente, Lisboa, 2005, ISBN 972-785-084-7.
A saudade do Álvaro José (onde quer que estejas!)
Cortesia da F. Oriente/JDACT