NOTA: De acordo com o original
Primeira Gonferencia. 17 de maio
de 1891
«(…) Quasi que não
passava a navegação de costeira; fugia-se aos altos mares; apenas a bússola introduzida
pelos Árabes servia de instrumento náutico; consistiam os navios em náos, de cerca
de 200 ou mais toneladas, para carregamentos de mercadorias particulares; em galés
de guerra com tombadilhos á popa e proa, espigões de ferro na proa, vãos no centro
para 40 a 50 romeiros, dous ou tres mastros para pequenas velas; em galeotas que
se armavam também em guerra, mais pequenas; em caravellas e fustas, sem convez,
e as maiores de cem toneladas, e ninguém ousava praticar viagens sinão com a terra
sempre á vista. Os Venezianos, Genovezes, Pizanos, e Catalães iam buscar as mercancias
indiàticas ao Egypto, á Syria, á Constantinopla, ao mar Negro, onde ellas chegavam
em caravanas, provenientes pelo golpho Pérsico e pelo mar Vermelho; percorriam o
Mediterrâneo, dobravam as costas de Portugal e Hespanha, dirigiam-se á França, Inglaterra,
Allemanha e até á Moscovia. Os Normandos, Bretões e Flamengos seguiam do norte para
o sul encostados tambem e sempre á terra, e penetravam no Mediterraneo. Os Arabes
conheciam únicos a navegação do Indostão e da Africa oriental, onde largamente traficavam,
trazendo do Egypto para a Mauritania os géneros de que careciam.
É mister penetrar nestas
miudezas para se compreender a temeridade dos Portuguezes ao coalhar os mares com
navegantes e descobridores de terras: hoje a navegação é facil, grandes os navios,
movidos até pelo vapor, machinismos o construcções admiráveis, instrumentos
náuticos perfeitos, conhecidos os caminhos talhados nos oceanos, e manifestas as
posições dos astros: então eram tudo trevas, difficuldades, perigos, terrores.
Que fim tinham levado as
ilhas da Atlantida e das Antilhas, de que fallaram Platão e Aristóteles? As terras
que os Phenicios diziam ter conhecido, e que denominavam afortunadas? Onde estavam
as ilhas das sete cidades e de S. Barandon, que se inscreviam nas cartas geographicas
da época, confusa e diferentemente? Por que se não chegaria ao mar tenebroso, como
se intitulava o Atlantico próximo ao equador, ás zonas torridas, que se pintavam
inaccessiveis e inhabitaveis? Por que se não dobraria a Africa, que se pensava
acabar á 10 gráos de latitude Norte, correndo então para o oriente á ajuntar-se
ás Indias, conforme os dizeres dos Arabes, que de Marrocos por terra chegavam até
quasi o Senegal?
Todas estas questões se propunham
e ventilavam-se no areopago fundado em Sagres pelo infante Henrique de Vizeu. Plinio,
Ptolomêo, Strabo, o Veneziano Marco Paulo (?), os Arabes Endrisi e Averrohes, eram
os oraculos pelos seus livros; Jaime Malhorca e Vasseca os desenhadores mais habilitados
de cartas geographicas. Convém aqui summariar as lendas que a respeito se espalhavam,
e que, acreditadas não só pelo vulgo, como pelos espirites cultos e sabios da epoca,
espalhavam terrores de approximar-se ao sul da Mauritania». In J.
M. Pereira da Silva, Conferências Públicas, propriedade do Instituto Histórico
e Geographico Brazileiro e Academia Real de Sciencias de Lisboa, Brazil, Rio de
Janeiro, Imprensa Nacional, Library University of California, 1892.
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Lisboa/JDACT