sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Poesia no 1º dia. Chuvoso. Húmido. Maria Tereza Horta. «Que vislumbre escondido de melhores dias ou horas no teu campo cabe? Véu nupcial do fim de fins e dores. Nem sei a angústia que vens consolar-me. Deixa que eu durma, deixa que eu acabe e que a luz nunca venha despertar-me»

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As nossas madrugadas
«Desperta-me de noite
o teu desejo
na vaga dos teus dedos
com que vergas

O sono em que me deito
pois suspeitas
que com ele me visto
e me defendo

É raiva
então ciúme
a tua boca

É dor e não
queixume
a tua espada

É rede a tua língua
em sua teia
é vício as palavras
com que falas

E tomas-me à força
não o sendo
e deixo que o meu ventre
se trespasse

E queres-me de amor
e dás-me
o tempo

A trégua
A entrega
E o disfarce

Lembras os meus ombros docemente
na dobra do lençol que desfazes
na pressa de teres o que só sentes
e possuíres de mim o que não sabes

Despertas-me de noite
com o teu corpo

Tiras-me do sono
onde resvalo
E eu pouco a pouco
vou repelindo a noite

E tu dentro de mim
vais descobrindo vales»


Entre nós e o tempo
«Assim... meu amor
penetra o tempo

as ancas devagar
as pernas lentas

o charco dos teus olhos
e a laranja
a palpitar dentro do meu ventre

Assim... meu amor
penetra o tempo

a boca devagar
os dedos lentos

a raiva do punhal que enterras
no sol pastoso
do meu ventre

Assim... meu amor
penetra o tempo
os rins devagar
o espasmo lento»

Rosa
«Desenha no meu ventre
a rosa
com o teu sumo

Ó meu amor!

Como a tua boca
é doce
no cimo das minhas pernas»
Poemas de Maria Tereza Horta, in ‘As Palavras do Corpo

In Maria Tereza Horta, As Palavras do Corpo, Publicações dom Quixote, Lisboa, 2014, ISBN 978-972-204-903-0.

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