segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Estâncias Reunidas. Poesia. António Cândido Franco. «Sinais. Nomes. Pistas. Da vida os figurinos as formas desenhando»

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IX
«e encontrar na fazenda de dentro
sobre o pólo
essa flor de neve.
Regulus é do céu outra flor.
Girassol celeste com pétalas de oiro
esta flor tem uma memória.
Sua sangue.
Flor de ardor
consumindo o seu coração.
Marte é o fogo a crepitar nas pétalas
da rosa.
Paixão de pedra
em gotas de orvalho frio
no fundo orgânico da noite abrindo.
O céu é uma outra terra
uma planície onde
com todas as cores
uma flora vegetal desabrocha.
Spica é uma espiga azul
de luz em grãos se desfazendo.
Vénus é de marfim
um jacinto quente.
Castor e Pólux duas margaridas brancas
e Aitaír um gladíolo.
Nebulosas silvestres
da noite rebentando a meio.
Perfumes de luz
nos campos correndo do céu.
Via Láctea de pólen
da nocturna Primavera no ar voando.
Júpiter no lodo celeste
abrindo em nenúfar.

Vega
na margem de uma estrada
como uma hidrângea brilhando azul.
Sóis como torrados campos de girassol.
Aldebarã investindo nos céus
com um sol vegetal
uma espiga verde de sangue.
O céu é uma câmara
que de noite revela
em estrelas
a vida terrestre.
Invisíveis sombras
que do dia luzindo
são a memória.
Sinais.
Nomes.
Pistas.
Da vida os figurinos
as formas desenhando.
Constelações vivas e sensíveis
como animais da terra.
Constelações primitivas
como do jurássico fauna terrestre.
O céu é uma memória eterna.
Um alfabeto de formas.
Monstros mitológicos
povoando a floresta
do firmamento.
O céu a arca é
de um outro dilúvio eterno.
Amalteia espremendo
no pico dos céus»
Poema de António Cândido Franco, in ‘Estâncias Reunidas

In António Cândido Franco, Estâncias Reunidas, 1977-2002, Quasi edições, biblioteca Finita Melancolia, Vila Nova de Famalicão, 2002, ISBN 972-8632-64-9.

Cortesia de Quasi/JDACT