Cortesia
de wikipedia e jdact
«O homem e a hora são um só
Quando Deus faz e a história é feita.
O mais é carne, cujo pó
A terra espreita.
Mestre, sem o saber, do Templo
Que Portugal foi feito ser,
Que houveste a glória e deste o exemplo
De o defender,
Teu nome, eleito em sua fama
É, na ara da nossa alma interna,
A que repele, eterna chama,
A sombra eterna».
Fernando
Pessoa, in Mensagem
Considerações
iniciais
«João
I, décimo rei de Portugal e o primeiro da segunda dinastia, foi uma figura de
relevo na História de Portugal. A sua vida, mas sobretudo a época conturbada em
que viveu foram, ao longo dos séculos, alvo de diversos estudos e investigações
que procuraram, tendo em conta os seus propósitos, clarificar o papel que o
monarca desempenhou nesse período da nossa História. A Crónica de D. João I, escrita
pelo cronista Fernão Lopes no século XV poucas décadas após a morte do Rei,
desde cedo se tornou o texto de referência sobre essa época e os seus
intervenientes, apresentando um relato organizado e consistente dos
acontecimentos históricos em torno da figura histórica de João I (antes e depois
de se ter tornado rei). Precisamente por se ter tornado uma obra de referência,
os estudos posteriores que se debruçaram sobre a figura de João I (ou, mais
genericamente, que tiveram como preocupação desenvolver temáticas como a crise
política de 1383-1385 ou a Batalha de Aljubarrota, entre outras) acabaram
inevitavelmente por partir sempre do ponto
de vista histórico presente nas crónicas lopesianas, não
conferindo a merecida atenção a textos de outra índole que igualmente se
centram na figura do monarca.
Deste modo, julgamos ser
pertinente no momento actual debruçarmo-nos sobre o modo como a figura de João
I acaba por ser retratada, não somente nos registos historiográficos desde FL,
mas fundamentalmente num género literário muito específico, o poema épico, e particularmente numa
epopeia até agora praticamente
desconhecida: a Joanneida ou a liberdade de Portugal
defendida pelo senhor rey D.
João I da
autoria de José Correia Melo e Brito Alvim Pinto, publicada em 1782. Assim, com
esta investigação, pretendemos, em concreto:
Clarificar o conceito de poema épico,
evidenciando a sua preponderância ao longo dos tempos, em particular em
Portugal;
Compreender as razões que levaram
um autor da 2ª metade do século XVIII a elaborar um poema épico, escolhendo
como assuntos do mesmo a figura de João I;
a crise de 1383-1385 e o tópico
da Liberdade, procurando compreender igualmente a pertinência destes assuntos
na contemporaneidade do autor; no fundo, compreender quais foram as motivações
que estiveram na base da escrita da Joanneida;
Compreender de que forma é que
este texto épico se apropriou (ou não) dos relatos cronísticos que se centram
na figura de João I, nomeadamente as crónicas de FL como fonte histórica
predominante, de forma a evidenciar o contributo das mesmas para a escrita do
Poema;
Compreender o modo como o autor
se apropriou de inúmeros registos historiográficos posteriores a FL e a forma
como incorporou no seu Poema elementos presentes nessas obras;
Verificar a existência no Poema
de elementos que o autor criou per
si e questionar a razão da sua criação e inserção no Poema;
Analisar objectivamente a
estrutura do texto em causa, comparando-o com a de outros poemas épicos e
assinalando os aspectos em que a Joanneida
se aproxima ou se afasta do género épico;
Analisar o tratamento que o texto
épico faz da figura de João I (que aspectos da figura do monarca são
aproveitados em detrimento de outros e que justificações existem para esse
emprego) e constatar em que é que isso se aproxima ou se afasta dos relatos
historiográficos;
Demonstrar o contributo deste
texto para a construção de um retrato mítico da figura de João I, nomeadamente
enquanto rei (re)fundador». In Luís Miguel M Ventura, D João I, Um
retrato épico, Tese de Mestrado em Estudos Portugueses Interdisciplinares,
Universidade Aberta, 2009.
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