Cortesia
de wikipedia e jdact
Los
Angeles. Outubro de 2004
«(…) Por favor, não saia daí. Por favor, espere até à minha chegada. Maureen
projectou o pensamento em Peter, enquanto andava. Havia uma estranha ligação
entre os dois, desde crianças. Ela esperava agora que Peter pudesse sentir como
precisava desesperadamente falar com ele. Maureen tentara antes ligar para o
primo por meios mais convencionais, mas fora em vão. Peter detestava telefones
móveis e não tinha um, apesar das suas muitas súplicas ao longo dos anos. Além
disso, recusava-se a atender na extensão da sua sala, se estava absorvido no
trabalho. Ela acabou tirando os incómodos sapatos e guardou-os na enorme bolsa
de couro pendurada no ombro, enquanto corria na etapa final para o seu destino.
Prendeu a respiração ao virar a esquina, levantou os olhos para as janelas do
segundo andar e contou da esquerda para a direita. Deixou escapar um suspiro de
alívio ao ver a luz acesa na quarta janela. Peter ainda estava lá. Maureen
subiu a escada devagar, ganhando tempo para recuperar o fôlego. Virou à
esquerda no corredor e parou ao alcançar a quarta porta à direita. Peter estava
sentado à sua mesa, examinando com uma lupa um manuscrito amarelado. Sentiu a sua
presença antes de vê-la na porta.
Ao levantar os olhos, seu rosto
se desmanchou num sorriso acolhedor. Maureen! Que surpresa maravilhosa! Não
esperava vê-la esta noite. Oi, Pete, murmurou ela, no mesmo tom afectuoso, contornando
a mesa para um abraço intenso. Fico contente que ainda esteja aqui..., fiquei
com medo de que já tivesse ido embora e precisava desesperadamente falar consigo.
Ele alteou uma sobrancelha e reflectiu por um longo momento, antes de
responder: em circunstâncias normais, eu já teria ido embora há horas. Mas
senti-me compelido a trabalhar até mais tarde esta noite, por alguma razão que
não entendi direito..., até agora. O padre Healy deu de ombros, com um sorriso
jovial e sugestivo. Maureen retribuiu com o mesmo sorriso. Nunca fora capaz de
explicar em qualquer nível lógico a ligação que tinha com o primo mais velho.
Mas desde o dia em que chegara à Irlanda, quando menina, eram íntimos como gémeos,
partilhando uma fantástica capacidade de se comunicarem sem palavras.
Maureen enfiou a mão na bolsa e
tirou um saco plástico de compras azul, do tipo usado por importadoras no mundo
inteiro. Continha uma caixa rectangular pequena, que ela estendeu para o padre.
Ah, Lyon's Gold Label! Uma grande escolha. Ainda não consigo suportar o chá
americano. Maureen fez uma careta e estremeceu, para indicar sua aversão partilhada.
Água de pântano. Creio que a chaleira já está cheia de água. Basta ligar e
daqui a pouco tomaremos um chá. Maureen sorriu, enquanto observava Peter
levantar-se da velha cadeira de couro que ganhara da universidade. Ao aceitar o
cargo no Departamento de Extensão de Ciências Humanas, o estimado dr. Peter
Healy recebera uma sala com janela. Os móveis eram modernos, com mesa e cadeira
novas e funcionais. Peter detestava o funcional em matéria de mobília, mas
detestava ainda mais o moderno. Usando o seu charme gaélico como uma força
irresistível, ele conseguira atiçar o estafe, em geral impassível, para uma actividade
frenética. Era um sósia do actor irlandês Gabriel Byrne, uma aparência que
nunca deixava de atrair as mulheres, com ou sem o colarinho clerical. Os
funcionários procuraram em porões e salas de aula em desuso, até encontrarem
exactamente o que ele procurava, uma cadeira de couro de encosto alto, bastante
confortável, e uma mesa de madeira que pelo menos parecia antiga. Os confortos
modernos na sala eram da sua escolha: o pequeno frigorífico no canto, atrás da
mesa, uma pequena chaleira eléctrica para ferver água e o telefone, que costumava
ignorar.
Maureen
sentia-se mais relaxada agora, enquanto o observava, segura na presença de um
parente próximo, absorvida na arte tranquilizante e absolutamente irlandesa de
fazer chá. Peter voltou até a mesa e inclinou-se para o pequeno frigorífico no canto.
Tirou uma caixa de leite pequena e pôs ao lado do açucareiro branco e rosa, em
cima do frigorífico. Há uma colher em algum lugar..., ah, aqui está! A chaleira
começou a apitar, indicando que a água estava prestes a ferver. Pode deixar que
eu faço o chá, ofereceu Maureen. Ela levantou-se e pegou a caixa de chá na mesa
de Peter. Abriu o lacre de plástico com a ponta da unha. Tirou dois saquinhos
redondos e largou-os em canecas diferentes, manchadas de chá. Os estereótipos sobre
os irlandeses e o álcool eram um exagero dramático, na perspectiva de Maureen;
o verdadeiro vício irlandês era o chá. Ela terminou os preparativos com a
devida eficiência e entregou uma caneca fumegante ao primo. Foi se sentar na
cadeira na frente da mesa. Com a sua caneca na mão, Maureen tomou um gole do
chá, calada, sentindo que os benevolentes olhos azuis de Peter a contemplavam».
In
Kathleen McGowan, O Segredo do Anel, Editora Rocco, 2006, ISBN 853-252-096-0.
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