Do
Tempo das Pirâmides ao Tempo das Catedrais. Viagens
ou Comunhão de Espírito?
«(…)
O Egipto e a
Bíblia
A Bíblia foi um livro de
referência para os imagineiros da Idade Média. A Bíblia no seu sentido mais
alargado, uma vez que os livros ditos apócrifos, fundamentalmente por
razões de propaganda dogmática, foram também largamente utilizados como livros
canónicos. O sábio alemão Siegfried Morenz, que se debruçou sobre o problema
das relações entre a Bíblia e o Egipto, considerava que a contribuição egípcia
para o livro sagrado dos cristãos era bastante considerável. Quando os
escultores faziam nascer na pedra os temas bíblicos, prolongavam desse modo o
pensamento egípcio sob a forma que lhes era própria. Em certos casos, as passagens
da Bíblia, nomeadamente no domínio dos Hinos, dos Salmos ou dos tratados
relativos à Sabedoria, são adaptações, ou melhor, traduções de originais
egípcios. Pensemos, por exemplo, na adaptação bíblica do grande hino do faraó
Akhenaton, na glória do poder divino que anima todos os seres criados. Para
interpretar a Bíblia à luz do Egipto, seriam necessários, sem dúvida, vários
volumes.
O Coração dócil
de Salomão
O princípio de realeza hebraico
não pode ser entendido sem referência à realeza egípcia. O orientalista
Frankfort demonstrou claramente que o abandono do princípio real pelos hebreus
isolou-os da grande corrente tradicional. Quando reza, o grande Salomão faz um
pedido particular ao Senhor: ter um coração dócil. Expressão de cariz muito
egípcio. Na simbólica faraónica, o coração é, o símbolo da consciência.
Nos hieróglifos, a palavra coração á representada por um vaso. É entendido
como o receptáculo interior do homem, o lugar, onde acolhe as directivas
divinas. O coração dócil de Salomão não é mais que a inteligência do
coração, a intuição das causas de que o rei das tradições antigas se serve para
fazer do seu reino uma terra celeste. Somos também levados a pensar num dos
aspectos da simbólica do Graal, por vezes considerado como um cálice tão
precioso que contém os segredos do universo; e igualmente evocamos o sagrado
coração, de Cristo onde os fiéis encontram refúgio.
A Sombra do
Senhor
É no Rei-Deus, concebido não como
um indivíduo mas como uma entidade simbólica à medida do cosmos, que os
indivíduos encontram equilíbrio e segurança, As Lamentações mostram que
as nações vivem na sombra do senhor, que é o sopro das narinas, ou seja, o
princípio vital que anima os seres. Ora o faraó Ramsés II era evocado nesses
termos: tu que és o sopro das nossas narinas, falcão que protege os seus
súbditos com as asas e sobre eles derrama a sombra. A sombra pode, por
conseguinte, ter um valor positivo. Não é o peregrino, no interior da catedral,
protegido pela sombra das abóbadas para que o sol nele renasça?
A Torre de Babel
Jeová,
inquieto pelos conhecimentos ostentados pela comunidade dos construtores,
estabelece a confusão das línguas para impedir que os Irmãos se compreendam e
levem a bom termo a construção da torre de Babel. O demiurgo bíblico desempenha
assim a mesma função que o deus egípcio Thot que separa as línguas de país em
país». In Christian Jacq, Le Message des Constructeurs de Cathédrales,
Éditions du Rocher, 1980, A Mensagens dos Construtores de Catedrais, Instituto
Piaget, Romance e Memória, Lisboa, 1999, ISBN 972-771-129-4.
Cortesia
de IPiaget/JDACT