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Do
Tempo das Pirâmides ao Tempo das Catedrais. Viagens
ou Comunhão de Espírito?
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O Gnosticismo Egípcio
Entre os principais temas
gnósticos está a Luz divina, que se incarna na pessoa simbólica de Cristo,
muito mais importante que o Jesus histórico. Como não pensar então numa
tradução gnóstica de Ra, o deus-sol dos egípcios que sustenta a energia
do universo? Um mito egípcio, de que são conhecidas numerosas versões, conta
como o Olho do Sol, tomado por uma cólera terrível, abandona o astro do dia e
foge para longe, para o deserto. O pavoroso resultado dessa fuga é o desequilíbrio
do mundo e o fim certo da humanidade. Thot, o senhor dos hieróglifos, o
santo patrono da ciência sagrada, foi encarregado pelo Criador de apaziguar a
cólera do Olho e de transformar a raiva em amor. O deus de cabeça de íbis conseguiu
levar a bom termo a sua missão, trazendo o Olho para o Egipto. A ordem
primordial foi assim restabelecida. Os gnósticos puseram este mito em paralelo
com a redenção da humanidade, conseguida pelo Salvador. Mas também redenção do indivíduo,
que tem de encontrar o Olho perdido de modo a recuperar um olhar total, uma
visão do mundo que seja Amor. Não apenas um amor afectivo mas também o Amor que
nasce do Conhecimento, pela virtude dos ensinamentos de Thot. O primeiro
dever do faraó era o de sacralizar a terra egípcia, fazer dela uma terra
celeste. Se a Gnose insistiu no carácter maléfico da matéria desviada em
relação à Luz, não esqueceu este processo de sacralização. Como não o
esqueceram os Mestres de Obras da Idade Média, que se lembravam das palavras de
Hermes Trismegisto (nome que os gregos davam a Thot) : ignoras tu, então, dizia
ele ao seu discípulo Asclépio, que o Egipto é a cópia do céu ou, melhor
dizendo, o lugar onde, aqui em baixo, se transferem e projectam todas as
operações que governam e empregam as forças celestes? Para dizer a verdade, a
nossa terra é o templo do mundo inteiro. Segundo diz uma profecia, os deuses um
dia voltarão a descer até nós. E já escolheram o lugar onde farão a sua morada:
no limite do Egipto, numa cidade fundada do lado poente. É para essa cidade que
os homens se dirigirão para reencontrar a Sabedoria.
Os Judeus do Egipto
A cabeça do Egipto, o primeiro
dos nomos ou províncias, situava-se em Elefantina, onde se encontra a
fonte mítica do Nilo, rio ao mesmo tempo celeste e terreno. Foi em Elefantina
que se instalou uma colónia judia, que não se contentava apenas em desempenhar
um papel económico mas que desenvolveu uma forma religiosa original, composta
por elementos hebraicos e egípcios. Como os judeus tinham igualmente uma
presença notável em Alexandria, consegue perceber-se que frequentavam os dois
pólos extremos do país dos faraós. É facilmente compreensível que os judeus que
rumaram a Ocidente trouxessem com eles ideias e símbolos que tinham praticado
no Egipto. O egiptólogo François Daumas, ao analisar os ritos do mistério do
nascimento divino no Egipto, constata que: ...tanto as formas literárias do
pensamento egípcio como o seu conteúdo não eram desconhecidas do judaísmo
tardio ortodoxo ou sectário. Vários indícios testemunham, por exemplo, que os
essénios (seita judia de que Cristo foi muito provavelmente um dos Mestres e de
que revelou uma parte dos mistérios na sua doutrina oral) do Khirbet Qumrân ou
os autores dos livros deuterocanónicos, que viviam no Egipto, conheciam a
literatura egípcia antiga ou contemporânea.
Moisés,
uma das personagens centrais do pensamento judaico, está ligado de forma
bastante estreita ao Egipto. O sacerdote erudito Henri Cazelles viu-se obrigado
a reconhecer que Moisés era um alto funcionário da corte egípcia. Além disso,
segundo os Actos dos Apóstolos, não tinha ele sido educado em toda a sabedoria dos
egípcios? É certo que algumas correntes do pensamento hebraico, com uma
surpreendente vaidade, afirmaram que as melhores inspirações da religião
egípcia lhes eram devidas. Só assim se percebe que Moisés tenha sido por vezes
apresentado como o criador e o mestre do alfabeto sagrado, em vez de Thot!»
In
Christian Jacq, Le Message des Constructeurs de Cathédrales, Éditions du
Rocher, 1980, A Mensagens dos Construtores de Catedrais, Instituto Piaget,
Romance e Memória, Lisboa, 1999, ISBN 972-771-129-4.
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