A
Mulher que Amou Jesus
«(…) Obrigado, Onri. Mas não acho
que deva candidatar-se a um cargo de diplomata. O pai de Quezia sorria. E,
na verdade, há romanos que são nossos amigos. Alguns deles são fregueses da
nossa loja e compram belíssimos colares e brincos para as suas esposas. Um
homem que faz questão de enfeitar a sua mulher com jóias de ouro não pode ser
totalmente mau. Habituada às arengas da sua família sobre vaidade, sem
mencionar as cantilenas contra os romanos, Maria deu uma risada. É, seria
divertido ir a uma ourivesaria e convidada a escolher alguma coisa. Uma brisa
fresca entrou na sala, vinda do pátio aberto. Maria podia ver o lago, do ponto
alto em que se encontrava. A casa, na colina, fora projectada para receber os
ventos de Verão. Parecia que o vento fazia tocar uma harpa. No Inverno, ficamos
lá dentro, disse a mãe de Quezia. Ficamos naqueles quartos pintados de
preto e vermelho, que agora são cores que estão na moda, no exterior. Faz
parecer mais quentinho e acolhedor. Mas numa época destas, quem vai pensar no Inverno?
O vento voltou a cantarolar, como um suspiro num timbre bem alto. Feio, o Inverno,
desencadeando tempestades no lago, pondo em perigo os barcos de pesca, com os temporais,
a neblina e o frio que entram em todas as casas. Não, Maria não iria pensar
nisso agora. Nunca agora, no Verão, com a terra aberta, dourada e quente, e o
lago amigável e seguro, cheio de barcos de todos os tamanhos. Maria é um nome tão bonito,
disse o pai de Quezia. Como se chamam os seus irmãos e irmãs? Maria é um
nome tão banal, pensou ela. Gentil da parte dele, elogiá-lo. Tenho dois irmãos.
O nome de um é Eli e o outro é Samuel. Mais nomes banais. O nome da
minha mãe é Zebida, acrescentou. Esse era um nome original; era o nome
da mãe de um antigo rei de Judá. Nunca conheci ninguém com o nome de Zebida,
disse a mãe de Quezia. Bom, eu nunca conheci uma Quezia nem um Onri, disse
Maria. Quezia é o nome de uma das filhas de Jó, disse a mãe. Isso, depois
que Deus lhe devolveu os seus bens. Significa cássia, um tipo de
tempero. Quando vimos o cabelo vermelho dela, ambos pensamos nesse nome.
E Onri? O que seria que
Maria tinha ouvido sobre Onri? Não era coisa boa. Onri era senhor do reino do
norte de Israel, disse o pai. Foi o pai de Ahab. Ela sabia! Ele era
malvado! E Maria controlou-se para não levar a mão à boca, em sinal de espanto.
Eu sei que dizem que ele foi mau porque, nos dias de hoje, considera-se mau
tudo e todos do reino do norte, disse o pai de Quezia. Mas vejamos
os factos. Maria não tinha a certeza de saber ver os factos, mas estava ansiosa
por ouvir a história. Foi ele que fundou a grande cidade de Samaria. Era para
ser a cidade rival de Jerusalém. Reconquistou territórios perdidos a leste do
rio Jordão e conquistou Moabe. Conseguiu fazer a paz com o reino de Judá, pondo
fim às guerras constantes entre os países irmãos. Foi um homem de quem devíamos
nos orgulhar e tentar imitar! Queríamos que o nosso filho fosse forte e
corajoso, disse a mãe de Quezia. E o chamamos de Onri. Quem conhece os
feitos de Onri, compreende. Os outros são ignorantes, tolos preconceituosos!
Como a minha família, pensou Maria. Eles não gostam do pessoal do reino do
norte. Sara, disse o marido. Não exagere. Podem ser ignorantes,
mas não os devemos chamar de tolos. Se ler os nossos livros de história, você
mesmo verá como são cegas essas pessoas. E ela lê livros? Sabe ler? A mãe de
Quezia virou-se para Maria. Você está aprendendo a ler? Quezia começou a
aprender recentemente. Não, eu..., quero aprender a ler, é a coisa que mais quero! Você gostaria de
aprender com a Quezia? As aulas são mais divertidas quando há mais alunos que
professores. Sim, venha, por favor!, disse Quezia. Vai gostar de meu mestre,
ele é muito divertido! Será que ela podia? Poderia escapar da família e vir
para aqui aprender a ler? Só de pensar nisso, ficou tonta de excitação.
São duas vezes por semana, disse
Quezia, na parte da tarde, quando a maioria das pessoas está descansando. Posso...,
posso pedir..., disse Maria, baixinho. Mas já sabia qual seria a
resposta. Nem adiantava pedir. E se eu pedir por você?, disse a mãe de
Quezia. Eu podia estender o convite... Não!, disse Maria,
rapidamente. Aí, teria que explicar à família como os conhecera e todo o resto
da história. E a resposta continuaria sendo não. Eu vou..., vou pedir..., disse.
E como nos vamos comunicar?, perguntou Quezia». In Margaret George, A Paixão de
Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência, Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN
972-883-911-1.
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