jdact
O papel da Escola na instrução do povo
«(…) Em Portugal, na época, era o Estado o elemento principal da instrução
primária. O regime liberal trouxera importantes princípios: o direito à instrução
gratuita, o ensino obrigatório, as escolas normais, o segundo grau, os cursos
nocturnos. Em trinta anos, segundo António Costa (1870), as escolas primárias
haviam passado de 991 para 2313, tendo aumentado também as escolas do sexo
feminino de 25 para 348, e o orçamento despendido duplicara. A reforma de 20 de
Setembro de l844, concedeu às câmaras e corporações locais a livre autorização
para com os seus orçamentos, fundarem escolas primárias. No entanto, esta
organização local do ensino, apostando no municipalismo como auxiliar do
Estado, não satisfazia as necessidades de instrução. A instrução primária
recebe também auxílio da acção particular, mas se das 125 escolas sustentadas
por associações e iniciativa individual, deduzirmos as 79 que possuem Lisboa, o
Porto e Bragança, restam-nos apenas 46 no reino e ilhas. Em suma, as
associações preocupavam-se mais com as questões da piedade do que com as
questões do ensino e a instrução primária continuava dependente da acção
centralizadora do Governo, não recebendo da localidade nem da iniciativa dos
cidadãos o auxílio necessário. Era assim urgente nacionalizar a escola local e popularizá-la.
A escola deveria contar com a ajuda do Estado, do município e da iniciativa particular.
Nas palavras de António Costa:
Pretende uma associação, um indivíduo fundar uma escola, uma bibliotheca
popular, uma publicação útil para as classes populares? Saiba desde logo o
individuo ou a associação, que a sua idea se não há de esterilisar, que o
estado o há de auxiliar no benéfico propósito.
António da Costa dizia-nos ainda:
Vimos a organisação da nossa instrucção primária, por excepção única no
mundo, basear-se na centralisação do estado, figurando a localidade, e a
iniciativa particular como tentativas proveitosas, mas não como elementos
nacionaes da educação publica (1871).
Conceito de Povo e de Educação Popular no século XIX
Poucas palavras têm um emprego tão frequente quanto a palavra povo.
Esse uso imoderado, embora natural no mundo em que vivemos, deu ao vocábulo uma
significação tão genérica, que a despojou de qualquer compromisso com a realidade.
Todos se consideram povo. No entanto, nem sempre assim foi. Facto é que o
conceito de povo se encontrava ligado à situação económica de classes sociais. Algumas
correntes identificam o povo com os trabalhadores. É verdade que em todas as
fases históricas, o povo se identificou com as classes trabalhadoras. No
entanto, isto não passa de uma inequívoca limitação. É importante assinalar que
o conceito de povo não pode ser definido senão considerando as condições reais
de tempo e de lugar. Nos finais do século XVIII, o conceito de povo compreendia
a burguesia.
Para Jaime Cortesão, historiador português do século XX, (citado por
Pintassilgo, 2006), o povo abarca todos os portugueses a qualquer classe a
que pertençam e todo esse povo está falho de educação. Nas palavras de
Pintassilgo, o Povo não surge idealizado sob o olhar de um intelectual, como
é Jaime Cortesão, apesar de sinceramente empenhado na educação popular
(2006). No entanto, como nos refere o mesmo autor, nas reflexões de Cortesão, encontramos
um olhar sobre o Povo marcado por alguma ambivalência: não obstante a
ignorância que o caracteriza, mantém algumas das virtudes da raça». In
Filomena M. F. Sousa Bruno, As Bibliotecas de Castelo de Vide e a Educação
Popular (1863-1899), CM de Castelo de Vide, Edições Colibri, 2011, ISBN
978-989-689-139-8.
Cortesia Colibri/JDACT