1125. Uma mesa de carvalho. Num grande
salão de um pequeno Condado chamado Portugale...
«O
pergaminho de velino envelhecido é uma doação de uma pequena vila perto da
cidade de Braga. Diz: eu, rainha dona Tereja, dou a Deus e aos cavaleiros do templo
de Salomão a aldeia chamada Fonte Arcada..., com todos os seus direitos e benefícios,
pelo bem da minha alma. A generosa doação inclui nada menos do que dezassete
concessões de terra adicionais por parte de famílias locais. Meticulosamente escrita
a pena e tinta, está assinada: eu, Guilherme, procurador do Templo neste território,
recebo este documento.
O signatário contém a chave de um
mistério. Como procurador do Templo, Guilherme Ricardo está investido do poder e
da autoridade para conduzir transações em nome do grão-mestre dos cavaleiros templários
em Jerusalém, Hugo Payens. Mas é muito mais do que isso. O seu nome surge numa segunda
concessão, desta vez como Magister Donus Ricardus, de metade da propriedade
de Villa-nova, doada por Àffonso Annes a Deus, e à irmandade dos cavaleiros templários.
Este Guilherme Ricardo é também o primeiro mestre dos cavaleiros templários num
pequeno condado chamado Portugale. Estes acontecimentos são extraordinários
porque o ano é 1125 e não se conhecem membros dos cavaleiros templários fora de
Jerusalém, muito menos numa região do lado oposto da Europa. Mais estranho ainda,
em 1111, sete anos antes de a irmandade templária surgir, foi atribuída aos cavaleiros
uma propriedade estratégica no mesmo território.
Três
coisas estão certas. Um: os cavaleiros templários juraram fidelidade não
ao papa, mas a um monge influente no condado francês de Champanhe. Dois:
num documento dirigido aos templários, um jovem destinado a ser rei de uma terra
que será conhecida como Portugal revela que na vossa irmandade e em todas as
vossas obras sou um irmão. Três: durante um interrogatório da Santa Inquisição
(maldita), um cavaleiro templário
fez uma afirmação críptica: existe na ordem uma lei tão extraordinária da qual
se deve guardar tal segredo que qualquer cavaleiro preferiria que lhe cortassem
a cabeça do que revelá-la a alguém.
E praticamente todos os templários
capturados provaram isto ao serem queimados vivos. O que se segue é a verdadeira
e inaudita história por detrás da primeira nação templária.
1095. Novembro. em Auvergne, uma região
montanhosa no centro de França...
A crescente
assembleia de abades, bispos, arcebispos, príncipes, nobres, senhores e leigos
reuniu-se no interior do grande salão da igreja em Clermont e aguardou a chegada
do papa. Quando avistaram a sua cabeça tonsurada a descer a nave, era óbvio que
Urbano II estava menos do que satisfeito. O longo ano de viagem levara o pontífice
a várias regiões de França e do Mediterrâneo, depois ao Norte de Itália, onde um
conclave eclesiástico, em Placência, testou a sua paciência, e os resultados estavam
longe do que esperava. Além disso, Placência, na Primavera, fora muito mais climaticamente
gratificante do que o amargo frio de Novembro de Clermont, neste ano do Senhor de
1095.
Urbano II levantou-se do lugar e dirigiu-se
ao conselho, começando com o seu relato sobre a situação da Igreja no Médio
Oriente. Além do problema de os turcos seljúcidas terem dominado a Ásia Menor e
tomado o controlo de grande parte do Levante, incluindo Jerusalém, este povo problemático
também cortara o acesso aos locais sagrados cristãos, contrariamente aos seus mais
tolerantes predecessores árabes.
E ainda não acabara. Urbano
também tinha um problema com os cristãos. Vira clérigos traficar propriedade da
Igreja, nobres e monarcas, em casa e no estrangeiro, que, espojando-se no luxo,
violavam constantemente as leis da Igreja em paz, provocando lutas com árabes apenas
pelos ganhos materiais. E, quanto aos seus cavaleiros, bem, portavam-se mais como
mercenários.
Depois da sua tirada, justificada,
segundo alguns, Urbano instigou zelo suficiente entre a multidão reunida para dar
início a uma cruzada e recuperar os locais sagrados cristãos dos infiéis e assim
canalizar toda aquela energia destrutiva para algo por que valesse a pena lutar:
eu, ou antes, o Senhor roga-vos, como arautos de Cristo, que divulgueis isto em
toda a parte e que busqueis que todas as pessoas, sejam de que classe forem, soldados
rasos e cavaleiros, pobres e ricos, levem rapidamente auxílio a esses cristãos e
que destruam essa raça vil das terras dos nossos amigos. Digo isto aos que estão
presentes, destina-se também aos que estão ausentes. Além do mais, Cristo o ordena».
In
Freddy Silva, Portugal, a Primeira Nação Templária, 2017, Alma dos Livros, 2018,
ISBN 978-989-890-700-4.
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