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Almeida Garrett
O Arco de Santana
«O Arco de Sant'Ana é um romance histórico escrito em 1845 e
prontamente adaptado a peça de teatro. Em 1850, surgiu mesmo como ópera, com
música de um compositor em voga na época, Fernando Noronha.
Almeida Garrett inspira-se num manuscrito achado no Convento dos
Grilos, no Porto, e na ‘Crónica de D.
Pedro’ de Fernão Lopes. Toda a acção decorre cerca de quinhentos anos
antes, no burgo do Porto, nas ruas que circundam a Sé e o largo do Paço Episcopal,
no reinado de Pedro I, o Justiceiro. Toma especial relevo a zona do ‘Arco de Sant'Ana’, por ser o lugar onde
viviam a Aninhas e a Gertrudinhas, heroínas românticas da obra e onde começa a
revolta do povo.
Todas as personagens são muito interessantes, mas tem especial destaque
o bispo do Porto, suprema autoridade da urbe, outrora cavaleiro, pessoa de má índole,
corrupto, devasso e que, por todos os meios, secundado pelo seu fiel lacaio
Pêro Cão, domina e explora o povo, cobrando-lhe toda a espécie de impostos em
excesso, prendendo e maltratando os menos conformados, roubando e violando as
suas mulheres e filhas! O povo, outra personagem importantíssima, tudo vai
suportando mas, a certa altura, é incentivado a manifestar-se e revolta-se, apesar
de continuar a temer o bispo e seus sequazes.
Neste movimento, tem papel fundamental uma terceira personagem, Vasco,
estudante, protegido do bispo (e que depois se sabe ser seu filho), rapaz de
bons princípios e apaixonado por uma linda donzela. Vai ser escolhido pelo povo
para capitão da revolta. A obra retrata cruamente o quase poder absoluto deste bispo
na cidade do Porto, apoiado no foral concedido por Afonso IV. Toda a acção é
despoletada pelo rapto de Aninhas e pela paixão de Vasco por Gertrudinhas que o
incumbe de implorar ao rei Pedro I, já com fama de justiceiro, que venha fazer justiça
ao povo revoltado, castigando o bispo e seus seguidores! De realçar que as
personagens femininas vão ser fundamentais para o desenrolar da acção:
- Gertrudinhas, a apaixonada de Vasco, bela e determinada, consegue estimular o povo a revoltar-se e responsável por mandar chamar o rei;
- Aninhas, esposa de um ourives, fora em negócios, mulher de grande beleza e honestidade, muito amiga de Gertrudinhas, raptada por Pêro Cão e seus homens, para servir os vis propósitos do bispo.
E ainda Ester, mulher abastada e de boa família, dotada de grande força
de carácter, que fora violada pelo cavaleiro que mais tarde veio a ser o bispo,
facto que teve como consequência o nascimento de Vasco. Quando este completou
dois anos, o bispo raptou-o à sua mãe, educando-o e protegendo-o, deixando
Ester com uma enorme sede de vingança. Por isso, não hesitou em transformar-se
na bruxa de Gaia, Guiomar, muito afamada e temida por todos, acompanhando
sempre, de perto, o crescimento do filho, fazendo-se presente em todas as situações
em que ele corria perigo, sem nunca se dar a conhecer. Toda a descrição dos diferentes momentos históricos, atitudes e
sentimentos das personagens, está muito bem delineada, levando o leitor a
assistir deleitado a uma belíssima procissão e, a seguir, a revoltar-se com o
povo, cheio de indignação por todos os ultrajes sofridos, a congratular-se pela
presença do rei justiceiro, a acompanhar o dilema de Vasco entre o amor ao pai
e o amor à justiça, a compreender a vingança de Ester e a viver o desenlace final.
Tudo acaba bem quando, chamado por Vasco, o rei entra na cidade, ouve
as razões do povo e de Ester, castiga o bispo e os malfeitores, fazendo justiça!
Celebra-se o casamento de Vasco e Gertrudinhas, o regresso do marido de
Aninhas e a escolha de um novo prelado para governar a cidade. Almeida Garrett
não perde nunca a oportunidade de ridicularizar alguns dos representantes do
clero e de pôr em relevo as virtudes e a sagacidade das suas heroínas!
É um romance muito interessante, apesar de sabermos que, na época que o
autor retrata, as mulheres não têm praticamente direitos reconhecidos. Mas o que
nos conta a história e que tudo e, mais uma vez, ocorre por acção das mulheres:
- são elas que provocam a revolta do povo, são elas que tomam as iniciativas para mudar a situação;
- são elas que conseguem que se faça justiça!
E ontem, como sempre, as mulheres, com o seu espírito de sacrifício,
trabalho, inteligência e astúcia, mudam a História!
O Arco de Sant'Ana dá-nos uma visão da organização social, concentração de poderes no clero e hábitos de vida das gentes do Porto. Lembra os velhos monumentos e deplora os atentados ao património.
Neste romance histórico, Garrett exalta o velho e o novo Porto, “a segunda cidade do reino e a mais livre e
independente pelo carácter dos seus habitantes”». In Maria de Fátima Vieira
Bastos, Voar Mais Alto, Universidade Sénior das Antas, Junho 2010, nº 2,
Cultura e Literatura.
O Arco de Sant'Ana!...
Gastei uma semana
Com a sua leitura
Mas que Literatura
Garrett nos legou!
Por fios e meadas,
Becos, ruas, estradas
Que Porto nos mostrou!
Do Arco, as vizinhas,
Gertrudes, ou Aninhas,
Nenhuma lhe escapou.
Do Bispo e seus sequazes,
De Vasco, flor dos rapazes,
Que coisas nos contou!
Duma bruxa, ou judia,
Que outrora seria
Jovem, bela e feliz
A quem o Bispo, então soldado,
Houvera desonrado,
O que o autor nos diz!
Mas há também um Rei
Que faz cumprir a lei
Com brio e justeza.
É Pedro Primeiro,
O Cru, ou Justiceiro,
Segundo a História reza.
Poema de Maria Elisette Claro Lopes
Cortesia de U. S. das Antas/JDACT