quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

Dona Maria Pia de Saboia. Maria Antónia Lopes. «Por estranho que pareça, Maria Pia só tinha estes dois nomes próprios, ao contrário dos irmãos, que, como era hábito, foram baptizados com vários…»

jdact

Rainha que o povo amou. Maria Pia de Sabóia (1847-1911)
Família, nascimento e baptismo
«(…) Um ano antes havia sido eleito Pio IX, que nessa altura augurava excelentes relações com os Saboias. O novo papa considerava o Piemonte um pilar da Igreja e a Casa de Saboia Piíssima, distinguindo-se pelo seu filial afecto pelos Pontífices Romanos. Carlos Alberto, devoto atormentado, sempre respeitou a Igreja, e no Verão de 1847, precisamente, tinha apoiado o papa contra a ocupação de Ferrara pelas forças austríacas. Quando meses depois nasceu uma princesinha Saboia, nesta corte tão rigidamente piedosas, nada mais natural que o sumo pontífice a tivesse apadrinhado. Assim, carecem de sentido os comentários acerca da estranha escolha que Vítor Manuel fez para padrinho da sua filha e a não menos estranha aceitação do papa, o seu grande inimigo. Quando a menina nasceu, o pai era apenas príncipe herdeiro e não manifestara ainda as suas convicções políticas. Foi sem dúvida Carlos Alberto, rei e chefe da família, a decidir essa escolha de tanto significado político. E foi através do pai que Vítor Manuel soube que o papa aceitara apadrinhar o filho que iria nascer. Nasceu uma filha, às seis da manhã do dia 16 de Outubro. O parto foi rápido e o nascimento deixou a mãe feliz, pois desejava uma menina.
Nesse mesmo dia, às dezassete e trinta, foi baptizada solenemente, sendo o padrinho representado pelo núncio papal. A cerimónia, brilhantíssima, sob todos os aspectos (nas palavras do mestre de cerimónias), decorreu com rígido protocolo e aparato. Um cortejo de coches ladeados por pajens do rei caminhando a pé dirigiu-se à nunciatura a recolher o representante do papa, monsenhor Altonucci. O baptismo da princesa foi ministrado pelo arcebispo no palácio real e na presença dos reis seus avós, do pai e dos irmãos, das mais altas personalidades da corte e do primeiro-secretário de Estado. A recém-nascida apareceu nos braços da marquesa de Pallavicini, dama da rainha, que se colocou à esquerda do núncio. O arcebispo iniciou então a cerimónia e por ordem do rei impôs à criança o nome de Maria Pia. Terminada a função, a menina foi mostrada a todos os presentes!
Por estranho que pareça, Maria Pia só tinha estes dois nomes próprios, ao contrário dos irmãos, que, como era hábito, foram baptizados com vários. Na sua família sempre lhe chamaram apenas Maria e no palácio era a principessa Maria. Mas o seu nome era Maria Pia, em homenagem ao ilustríssimo padrinho. A escolha agradou à sua família austríaca. O avô materno, ao felicitar o genro pelo nascimento da menina, faz votos de que os nomes de Maria e de Pia lhe tragam felicidade e que seja a consolação dos seus pais, como a sua mãe foi a nossa.
Em 1847 o reino da Sardenha era constituído pela ilha do mesmo nome, pelo Piemonte, onde se localizava a capital do reino, Turim, pela antiga república de Génova e ainda pelo condado de Nice e ducado de Saboia, territórios que actualmente integram a França. A aspiração a uma unidade política da Itália era já bem viva, sustentada por monárquicos liberais e por republicanos. Os Saboias serão os condutores dos primeiros, conseguindo fazer da Península Itálica um reino unido sob um regime parlamentar. Será uma causa exaltante, de feição romântica, conduzida pelo ministro Cavour e pelo rei Vítor Manuel II, que fará dele o pai da Pátria. Um processo longo, culminando em 1870 com a ocupação de Roma, doravante a capital da Itália. Maria Pia viverá tudo isto de longe. Verá a sua pátria, que ama entranhadamente, construir-se gradual e gloriosamente, ignorando-a a ela, uma Saboia, filha do fundador, sem que em nada possa intervir.
Carlos Alberto iniciou a expansão territorial na direção da Lombardia, atacando os Habsburgos que a governavam e que eram a sua própria família, mas foi infeliz. Derrotado em Novara, em Março de 1849, abdicou do trono, despojou-se de tudo e saiu precipitadamente de Itália, com destino incerto. Dirigiu-se, por terra, para Portugal. Não providenciara uma abdicação formal escrita. Foi necessário que enviados especiais o encontrassem, já em território espanhol, para que produzisse um documento que incontestavelmente fazia do seu filho rei da Sardenha-Piemonte. Com 50 anos, Carlos Alberto sempre fora uma personalidade difícil de compreender. Extenuado e doente, o ex-rei da Sardenha morreu no Porto a 28 de Julho de 1849. Este fim conferiu-lhe uma aura romântica que fez esquecer as suas tergiversações». In Maria Antónia Lopes, Rainha que o povo amou, Dona Maria Pia de Saboia, Círculo de Leitores, 2011, ISBN 978-972-424-718-2.

Cortesia de CLeitores/JDACT