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Infanta
dona Urraca (1150?-1222?). Filha de Leão;
filha de Afonso Henriques de Portugal; mulher do rei Fernando II de Leão; mãe
do rei Afonso IX de Leão
«(…)
Fernando II de Leão deu-se então conta de que não estava em condições de
combater em duas frentes simultaneamente, por um lado Castela e por outro as
terras galegas. O resultado foi concertar um novo encontro com o rei português.
A 30 de Abril de 1165, Fernando e Afonso reuniram-se sobre o Lérez na Ponte
Velha [actual Pontevedra] e ambos se mostraram dispostos a acordar numa
verdadeira e mútua paz entre eles e os seus reinos. É então que a infanta
Urraca deixa de ser pela primeira vez apenas um nome nos documentos, e se
converte em parte essencial de um facto histórico de importância transcendente,
pois por meio da aliança de Pontevedra o pai concerta de forma clara o seu
matrimónio com o rei de Leão. A infanta andaria então pelos seus quinze anos, enquanto
o seu futuro marido andaria pelos vinte e oito. A descrição que é feita do
casal no momento do casamento é um tanto hagiográfica. O rei, forte e
guerreiro, excelente cavaleiro, generoso. A rainha, pacífica e piedosa. Mas o tópico
não tem necessariamente de ser falso.
Quanto às características do monarca,
talvez seja interessante assinalar que Fernando era conhecido pelos chefes muçulmanos
por o baboso. Seja como for, não é essa a questão mais importante em relação
aos reis, mas outra: por que casaram sem disporem antes da dispensa papal?
Devemos recordar que a proibição de contrair matrimónio entre parentes ia na altura
até ao sétimo grau, portanto era obrigatório que houvesse uma dispensa papal
para que fosse válido. Que razão levou a que essa dispensa não fosse solicitada
de antemão? Fica a impressão de que a boda de Urraca foi celebrada com demasiada
celeridade, provavelmente devido à necessidade política de ambas as partes, o monarca
de Portugal e o de Leão. Conseguir a paz entre os reinos terá parecido a ambos ser
mais urgente do que garantir um trâmite que supostamente não apresentaria qualquer
dificuldade.
Curiosamente, o tema que poderia ser
motivo de discussão entre as partes do matrimónio, o do dote, parece ter-se resolvido
sem problemas. O rei outorgava à infanta várias vilas como arras, entre as quais
se destacava a de Gema, perto de Zamora, e a citada Castro Toraf. A partir da sua
boda com Fernando, e nos seis anos seguintes, os únicos dados certos sobre Urraca
são os que se retiram dos registos que têm o seu nome a seguir ao do rei, nos sucessivos
actos de doação de bens e privilégios que a coroa ia outorgando a diversos mosteiros,
ordens religiosas ou particulares. Segundo esses diplomas, a primeira vila em que
se encontra o casal já unido pelo matrimónio é Valdeorras, então chamada Jardim
do Poente, onde estavam a 16 de Junho de 1165.
Naquela época, as cortes
peninsulares eram sempre itinerantes, e uma rainha tinha de se acostumar a movimentar-se
de um local para outro, levando consigo os poucos elementos de comodidade que compunham
o seu enxoval. Os limites da cidade de Leão estavam a expandir-se paru lá da
robusta e maltratada muralha romana. Como cristã e piedosa rainha que era, segundo
a tradição uma das primeiras visitas que terá feito foi ao Hospital de São Marcos,
que se dedicava principalmente a dar hospedagem a peregrinos. Sendo assim, terá
orado na vizinha igreja de Santo Isidoro, que continha uma forte torre e um
antigo e venerável cemitério real, e cujas abóbadas Fernando mandaria mais tarde
decorar com frescos. Numa delas, aparecem os monarcas de joelhos, em oração, sob
uma cruz, segundo o esquema tradicional utilizado pelos artistas para dar testemunho
dos patronos da obra. Na sua execução primitiva, a pintura comove pelo seu realismo.
Sugeriu-se que naquela posição os reis pedem misericórdia a Cristo pelos seus pecados.
Poderá considerar-se uma expressão pública de expiação pelo facto de terem casado
sem dispensa papal?
Durante
a ausência do monarca para as bodas, os Lara, linhagem nobiliárquica que detinha
então o domínio sobre o rei-menino de Castela, aproveitaram para atacar várias
povoações da fronteira leonesa. Devido a isso, Fernando esteve pouco tempo em Leão,
e viu-se obrigado a penetrar no reino do sobrinho e assediar Medina del Río Seco.
Não se sabe se a rainha o acompanhou nesta missão». In Marsilio Cassotti, Infantas de
Portugal, Rainhas de Espanha, tradução de Francisco Boléo, A Esfera dos Livros,
Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-396-6.
Cortesia
ELivros/JDACT