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de wikipedia e jdact
The British Museum. Londres. 14 de Novembro
«(…) Lá em baixo, a habitualmente calma e digna rua de
candeeiros de ferro e amplos passeios tinha-se transformado num campo de
batalha surrealista. Carros de bombeiros e da polícia entupiam a avenida. Fumo
ondeava apesar da chuva, mas pelo menos a terrível tempestade abrandara para o
habitual lacrimejar londrino. Com os candeeiros da rua apagados, a única
iluminação vinha das luzes de sinalização no cimo dos veículos de emergência.
Contudo, no fundo do quarteirão, um brilho carmesim mais intenso cintilava por
entre o fumo e a escuridão.
Fogo.
O
coração de Safia bateu com mais força, a respiração estrangulou-se, não por
antigos terrores, mas por novos receios pelo presente. O museu! Deu um sacão
aos cordões dos estores, esventrando-os, e atrapalhou-se
com o fecho da janela. Abriu de rompante a vidraça e inclinou-se para fora de
encontro à chuva. Mal notou os pingos gelados. O British Museum ficava a poucos
metros do apartamento. Ficou assombrada com a visão. A parte nordeste do museu
ficara reduzida a uma ruína a arder. Chamas tremulavam através das janelas
superiores, enquanto o fumo se precipitava para fora em manchas espessas.
Homens, cobertos com máscaras de oxigênio arrastavam mangueiras. Jactos de água
atingiam grande altura. Escadas erguiam-se no ar a partir dos carros dos
bombeiros. Mas, pior que tudo, um buraco escancarado fumegava no segundo piso
da parte nordeste. Fragmentos e blocos enegrecidos de cimento jaziam espalhados
pela rua. Ela não devia ter ouvido a explosão ou simplesmente atribuíra-a ao
ribombar da trovoada. Mas não se tratava da queda de um raio. Mais
provavelmente a explosão de uma bomba..., um ataque terrorista. Outra vez
não...
Sentiu
os joelhos a fraquejarem. A ala norte..., a sua ala. Ela sabia que o buraco
fumegante conduzia à galeria no final. Todo o seu trabalho, uma vida de
pesquisa, a colecção, uma infinidade de antiguidades da sua terra natal. Era
impossível de imaginar. A descrença
tornou a visão ainda mais irreal, um pesadelo do qual acordaria a qualquer
momento. Recuou para a segurança e sanidade do seu quarto. Voltou as costas aos
gritos e às luzes relampejantes. Na escuridão, libelinhas de vitral ganharam
vida. Abriu os olhos, incapaz de compreender a visão por um instante, depois
fez-se luz. A energia voltara. Nesse momento, o telefone tocou no seu suporte
nocturno, assustando-a. Billie levantou a cabeça da colcha, as orelhas
espetadas face ao chocalhar. Safia apressou-se para o telefone e levantou o
auscultador. Estou? A voz era austera, profissional. Doutora al-Maaz? S-sim? Daqui
fala o comandante Hogan. Houve um acidente no museu. Acidente? O que quer que
tivesse acontecido era mais do que um simples acidente.
Sim, o director do museu solicita a sua
presença na reunião de avaliação da situação. Pode juntar-se a nós na próxima
hora? Sim, comandante. Irei imediatamente. Óptimo. O seu nome será indicado ao
comando de segurança. O telefone produziu um estalido enquanto o comandante
desligava. Safia olhou em volta do quarto. Billie martelava a cauda em clara
irritação felina pelas constantes interrupções nocturnas. Não vou demorar, murmurou
ela, sem saber se era verdade. As sirenes continuavam a gemer do outro lado da janela. O pânico que a
despertara recusava-se a desaparecer por completo. A sua visão do mundo, a
segurança da sua posição dentro das paredes serenas de um museu, tinham sido
abaladas. Há quatro anos atrás, ela fugira de um mundo onde as mulheres atavam
explosivos ao peito. Fugira para a segurança e normalidade da vida académica,
abandonando o trabalho de campo pelo trabalho de gabinete, largando picaretas e
pás por computadores e folhas de cálculo. Escavara um pequeno nicho para si no
interior do museu, onde se sentia segura. Fizera ali o seu lar. Contudo, o
desastre encontrara-a». In James Rollins, A Cidade Perdida, Bertrand
Editora, 2015, ISBN 978-972-252-930-3.
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