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Cantares
do Sem-nome e de Partidas (1995)
«Que este amor não me cegue nem
me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua do estar sendo
perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar
sendo.
Que o olhar não se perca nas
tulipas
Pois formas tão perfeitas de
beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante
escuro
De um suposto de heras em alto
muro.
Que este amor só me faça
descontente
E farta de fadigas. E de
fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e
tenra
Como só soem ser aranhas e
formigas.
Que
este amor só me veja de partida.
E
só me veja
No não merecimento das
conquistas.
De pé. Nas plataformas, nas
escadas
Ou através de umas janelas baças:
Uma mulher no trem: perfil
desabitado de carícias.
E só me veja no não merecimento e
interdita:
Papéis, valises, tomos,
sobretudos
Eu-alguém travestida de luto. (E
um olhar
de púrpura e desgosto, vendo
através de mim
navios e dorsos).
Dorsos de luz de águas mais
profundas. Peixes.
Mas sobre mim, intensas, ilhargas
juvenis
Machucadas de gozo.
E que jamais perceba o rocio da chama:
Este
molhado fulgor sobre o meu rosto.
Isso de mim que anseia desepedida
(Para perpetuar o que está sendo)
Não tem nome de amor. Nem é
celeste
Ou terreno. Isso de mim é
marulhoso
E tenro. Dançarino também. Isso
de mim
É novo: Como quem come o que nada
contém.
A
impossível oquidão de um ovo.
Como se um tigre
Reversivo,
Veemente de seu avesso
Cantasse mansamente.
Não tem nome de amor. Nem se
parece a mim.
Como pode ser isto? Ser tenro,
marulhoso
Dançarino e novo, ter nome de
ninguém
E preferir ausência e desconforto
Para
guardar no eterno o coração do outro.
[…]
Hilda
Hilst, Obra Poética Reunida (1950-1996), 1998, organização Costa Duarte, Literatura
brasileira século XX, Wikipédia.
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