Catarina
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Cantares
do Sem-nome e de Partidas (1995)
«[…]
E por que, também não doloso e
penitente?
Dolo pode ser punhal. E astúcia,
logro.
E isso sem nome, o despedir-se
sempre
Tem muito de sedução, armadilhas,
minúcias
Isso sem nome fere e faz feridas.
Penitente e algoz:
Como se só na morte abraçasses a
vida.
É pomposo e pungente. Com ares de
santidade
Odores de cortesã, pode ser
carmelita
Ou Catarina, ser menina ou malsã.
Penitente e doloso
Pode ser o sumo de um instante.
Pode ser tu-outro pretendido, teu
adeus, tua sorte.
Fêmea-rapaz,
ISSO sem nome pode ser um todo
Que
só se ajusta ao Nunca. Ao Nunca Mais.
O Nunca Mais não é verdade.
Há ilusões e assomos, há repentes
De perpetuar a Duração.
O Nunca Mais é só meia-verdade:
Como se visses a ave entre a
folhagem
E ao mesmo tampo não
(E antevisses
Contentamento e morte na
paisagem).
O Nunca Mais é de planícies e
fendas.
É de abismos e arroios.
É de perpetuidade no que pensas
efémero
E breve e pequenino
No que sentes eterno.
Nem
é corvo ou poema o Nunca Mais.
Tem nome veemente. O Nunca Mais
tem fome.
De formosura, desgosto, ri
E chora. Um tigre passeia o Nunca
Mais
Sobre
as paredes do gozo. Um tigre te persegue.
E perseguido és novo, devastado e
outro.
Pensas comicidade no que é breve:
paixão?
Há de se diluir. Molhaduras,
lençóis
E de fartar-se,
O nojo. Mas não. Atado à tua
própria envoltura
Manchado de quimeras, passeias
teu costado.
O
Nunca Mais é a fera».
[…]
Hilda
Hilst, Obra Poética Reunida (1950-1996), 1998, organização Costa Duarte, Literatura
brasileira século XX, Wikipédia.
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