Início
de uma vida épica
Lisboa.
Maio de 1459
«(…) Em tempos idos, existiram
uns Cavaleiros denominados Templários. Eram destemidos defensores da Terra
Santa, e durante muitos anos mantiveram os sarracenos fora do lugar sagrado. Na
cidade de Jerusalém, não é verdade, senhor meu tio!? Dom João mostrava-se
atento e já conhecedor. É verdade! Mais tarde, intrigas políticas e acusações
maldosas levaram o Papa a ordenar a extinção da Ordem do Templários, mas em
Portugal foram considerados inocentes das acusações que lhes faziam. Esses
cavaleiros envergavam uma dalmática com uma cruz vermelha muito parecida com
aquela, apontando para a bandeira da Ordem de Cristo. É daí, que vem a origem
dos Cavaleiros de Cristo e por isso a parecença dos símbolos. É também por essa
razão que as velas das nossas naus a ostentam. Essa Ordem, sob minha tutela, está
à cabeça dos destinos das descobertas. A face do infante irradiava esperança e
esse mesmo entusiasmo aflorava no rosto do príncipe João.
Quem..., e como se pode pertencer
à Ordem?, questionou o príncipe. Pertencer à Ordem é por si só uma marca
distintiva, pois as condições impostas para ingressar são rigorosas, implicando
que muito poucos têm as qualidades necessárias para entrar. Participar nos
feitos de guerra é uma dessas condições, para ganhar honra. Muitos são os membros
da Ordem de Cristo que têm participado nas conquistas no Norte de África e nas
descobertas... João! Está na hora da vossa lição, o mestre aguarda-vos na sala de
estudo. Dona Isabel chamava com doçura o seu pequeno príncipe para os deveres
escolares. Esperai! Henrique impediu o petiz de lhe saltar dos joelhos. O vosso
mestre pode esperar! Quando se trata de apreenderdes qual será o futuro da
nação, sob a tutela do vindoiro Dom João, o segundo..., deixando no ar uma
premonição, ao mesmo tempo que mãe e filho aguardaram para o ouvir. Esta
bandeira da Ordem dos Cavaleiros de Cristo de ora em diante será hasteada nas
sete partidas do mundo, para honra e glória do reino. Posto isto, o infante Henrique
colocou o rapaz no chão, imaginado o futuro brilhante que ele teria pela frente
As despedidas foram breves, de
seu hábito pouco afeito a grandes exteriorizações. O infante viajou para Lagos,
para onde há muito se mudara de armas e bagagens, a fim de pôr em marcha os
planos que sempre tivera em mente. Agora, engendrando já as empresas seguintes,
na posse de mor conhecimento, julgava poder arriscar-se a maiores aventuras e
descobertas. No entanto, sensivelmente um ano e meio depois de ter em mãos a
preciosa informação de que carecia, morreria em Sagres, a uma quinta-feira, 13
de Novembro de 1460. Logo foi transportado para Lagos e as cerimónias fúnebres
decorrem na igreja de Santa Maria de Lagos, onde foi sepultado. Ainda no
decorrer do impulso por ele fomentado, os navegadores descobriram as restantes
ilhas do arquipélago de Cabo Verde, no ano de 1462. Aos poucos, a morte do
infante arrastou a decadência das suas ambições, o seu impulso foi esmorecendo
e as descobertas foram sendo passadas para segundo plano. El-rei Afonso V
estava mais empenhado nas conquistas do Norte de África, que davam nome aos
nobres pelos feitos realizados nas batalhas, e, atendendo aos meios escassos,
teve de fazer opções.
Lisboa,
centro do Mundo
Lisboa,
Julho de 1471
Lopo Barriga, sempre que
estava na cidade, convivia com os outros jovens militares e adaptava-se ao
bulício citadino. Um dos seus camaradas tornou-se seu companheiro de aventuras,
de seu nome Nuno Fernandes Ataíde, filho de Álvaro Ataíde, alcaide-mor e
senhor donatário de Alvor, no reino do Algarve d'aquém-mar. Os dois e, muitas
vezes, aliciando o príncipe e o seu amigo Afonso Albuquerque, que não se faziam
rogados, iniciaram a descoberta das animações que a capital lhes podia
oferecer, nas ruelas de fama duvidosa por eles preferidas, em escapadelas
furtivas. Quando os súbditos reconheciam o príncipe, desfaziam-se em infindáveis
salamaleques, e eles aproveitavam para sair tão rapidamente como entraram, para
evitar que a Corte fosse informada». In Luís Barriga, Em Nome D’El Rey, Clube do
Autor, Lisboa, ISBN 978-989-724-448-3.
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