Cortesia
de wikipedia e jdact
Relatório
de Projecto
«O
projecto prático Kamasutra ou Aforismos sobre o Amor é a materialização das
noções desenvolvidas ao longo deste relatório de projecto, em torno do papel/
função do ilustrador enquanto tradutor visual, pela sua capacidade em gerar
novas significações e diferentes contextos, reunindo condições favoráveis para
a criação de uma nova linguagem e novas realidades. A competência do
ilustrador/ tradutor em produzir novos códigos e signos, próprios da linguagem
visual, pressupõe o entendimento de algumas noções estruturais da linguística
que se consideram ser transversais ao campo visual. O resultado é a criação de
um híbrido entre livro de texto e livro ilustrado, que procura transmitir e
integrar os conceitos e ideologias compreendidas na obra original Kamasutra
de Vatsyayana, na tentativa de a estabelecer num novo contexto social e
cultural, distinguindo-se da abordagem e estética desenvolvida ao longo dos
últimos tempos, desde a sua incidência nos países ocidentais». In Resumo
«O
Kamasutra é um texto que se pensa ter cerca de 2.000 anos de existência, escrito
originalmente por Vatsyayana, um filósofo indiano que terá vivido num
período conhecido pelas grandes contribuições para a literatura sânscrita e
para a cultura védica. Uma obra sofisticada, geradora de controvérsia e
conhecida um pouco por todo o mundo. No entanto, o seu conhecimento não teve
início, no mesmo momento, em toda a área geográfica mundial, pelo que, a sua
primeira tradução do sânscrito para a língua inglesa, terá sido apenas
realizada no ano de 1883, pelo escritor, linguista e antropólogo inglês sir
Richard Francis Burton, marcando assim a entrada da obra nos países ocidentais
e o início da sua jornada, alvo de múltiplas interpretações e apropriações. A
obra de Vatsyayana é talvez uma das mais antigas que aborda temas como o amor,
o erotismo e a sexualidade, amplamente reconhecida pelo seu trecho referente às
posições que podem ser assumidas por um casal durante a copulação. O interesse
pelo Kamasutra, gerador de imensa curiosidade mas pouca análise, retido como um
escândalo no universo e realidade dos países ocidentais, foi o mote inicial
desta investigação, que deu origem ao capítulo 1 do relatório de projecto. As
opiniões expressas por Wendy Doniger e Sanjay K. Gautam, nas suas obras The
Mare’s Trap e Foucault and the Kamasutra, respectivamente, são revelantes nesta
investigação, porque julgamos que clarificam o sentido original do texto. O
Kamasutra é um livro que visa o equilíbrio entre o poder religioso, político e
social / cultural, considerados centrais na vida pessoal, individual e
colectiva de cada indivíduo. Redigido na forma de manual espiritual e
educativo, o seu objectivo é o de ensinar a gerir as nossas experiências
individuais ou compartilhadas (relacionamentos), perspectivando o alcance dos
vários prazeres da vida e, consequentemente, a felicidade, o bem-estar, a
plenitude. No entanto, o factor curiosidade e novidade, revelado pelos
ocidentais, terá transformado a obra num pequeno texto erótico, baseado apenas
num dos sete subcapítulos da obra, referente às posições sexuais; numa altura
em que diálogos e discussões, relativas ao tema da sexualidade, eram mantidas
em silêncio e constituídas como assunto tabu. Os restantes subcapítulos terão
caído no esquecimento ou, simplesmente, nunca terão sido conhecidos pelo
público em geral. Como resultado, o Kamasutra tornou-se, para a
sociedade em geral, um assunto pouco sério e trivial, um livro que implica
pouca ou nenhuma reflexão ou, nalguns dos casos, até, motivo de vergonha,
corroborando a trivialidade que se constitui para alguns; a descontextualização
e as interpretações, sob as mais variadas formas de exploração visual, que
advieram com base na obra Kamasutra, revelaram-se apenas fracas conjecturas de
um livro tão extenso e repleto de conceitos como este, o que terá gerado um distanciamento
por parte do público em relação ao real significado da mesma. Como tal,
motivados pela inexistência de artefactos / projectos que se considerassem
expressar o verdadeiro conteúdo da obra e pela descontextualização sofrida
desde a sua entrada no espaço geográfico ocidental, existiu a necessidade de
encontrar, no desenvolvimento desta investigação, o papel do ilustrador
enquanto intermediário entre o sentido original de um texto e o seu receptor,
por meio da ilustração. O ilustrador vê-se, então, preso no papel de tradutor
de significados, conceitos e ideologias, inicialmente expressos através da
linguagem verbal, em matéria visual; desenvolvendo métodos de construção de
significado que o capacitem para a transmissão dos conceitos que realmente sustentam
o Kamasutra. Neste sentido, pretende-se compreender quais as características
transversais à linguística e ao campo visual, na compreensão das linhas do
pensamento e da lógica que guiam o processo de codificação em ambos os sistemas
de linguagem. A procura de métodos de construção de significado e de tradução
de conceitos em matéria visual, percorreu os caminhos da hermenêutica, a arte
ou técnica de interpretar e explicar um texto ou discurso, aplicada à área da
ilustração, assim como o entendimento de algumas noções básicas de semiótica,
retórica e pragmática. A narrativa visual torna-se essencial na compreensão de
como todos estes conceitos se podem inserir no campo das imagens, na
estruturação de caminhos que guiam o leitor/ espectador pela sequência de
eventos criados e, neste sentido, perceber como podem coexistir texto (que nem
sempre assume, necessariamente, uma existência física) e imagem num mesmo
artefacto e, consequentemente, a sua importância na eficácia da transmissão de
uma determinada mensagem. (…) O projecto prático Kamasutra ou Aforismos sobre o
Amor surge precisamente, ora das semelhanças que partilha com os casos de
estudo ao nível formal e / ou conceptual, ora pelas diferenças, neste caso,
também elas determinantes no processo de tomada de decisões […]. In Mariana
Rebelo Costa, Kamasutra ou Aforismos sobre o Amor. O ilustrador enquanto
tradutor visual e verbal, Dissertação de Mestrado, Faculdade de Belas Artes,
Universidade do Porto, Relatório de Projecto, 2018.
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