A “Sempre-Noiva”. Política matrimonial e Diplomacia paralela
«(…) João III dá, então, resposta aos reis franceses em
forma de carta, assinada pelo secretário de estado António Carneiro. Nela,
lembra como:
O rei João III continua, afirmando que está disponível para pagar o dote da irmã, mas que não pode consentir na saída de D. Maria de Portugal sem estar casada, porque:
O rei esgrime, assim, um argumento que escapara a todos os diplomatas, mas que apenas contraria, no imediato, os objectivos de Francisco I. Com este despacho despediu-se do bispo de Ade, Maio (?) de 1542, dando-lhe algumas jóias e mil escudos em ouro. Porém, João III tinha já outros assuntos em que pensar. Logo em 1543 realiza-se o casamento que o rei mais ambicionava e para o qual negociava havia muito: o da sua filha Maria com o herdeiro de Carlos V, Filipe, ambos com 16 anos. A infanta D. Maria tinha então 22 anos. Durou pouco este casamento, cerca de dois anos, acabando com a morte da princesa ao dar à luz o desafortunado Carlos, primeiro neto do imperador e de Isabel de Portugal.
NOTA: Segundo o biógrafo da Infanta este casamento dever-se-ia
mais à vontade da rainha que do rei. Com efeito, o autor refere que o príncipe
João era doente e pouco capaz para gerar um herdeiro para o trono; razões de
Estado ditavam, então, que a princesa deveria casar com o infante Luís, seu
tio, garantindo a continuidade da Casa de Avis-Beja, enquanto Filipe deveria casar
com a infanta D. Maria, garantindo a amizade com Castela. Parece-nos, no entanto
que este entendimento dos factos se deve à parcialidade com que o biógrafo explica
os eventos em torno da Infanta. Assim, este consórcio interessava muito a João
III e a Portugal, e por outro lado o príncipe João não tinha mais de 6 anos de
idade, sendo, certamente, prematuro fundamentar alianças matrimoniais na sua
inépcia.
A data do poema Syntra de Luísa Sigeia, que tem uma
referência expressa a este casamento, é 1546.
Pouco depois surgia o projecto de fazer da infanta D. Maria
a segunda mulher de Filipe. A historiografia tradicional, sempre muito colada à
interpretação de frei Miguel Pacheco, viu em Carlos V o autor e impulsionador
da ideia. Todavia colocamos uma nova hipótese, pelas razões que passamos a
explicar. Não há qualquer registo documental da data em que a proposta chegou à
corte portuguesa, facto que não é pouco significativo atendendo às relações
privilegiadas (e constantes) entre as cortes portuguesa e imperial. Por
outro lado, é o próprio João III que numa carta a António Saldanha lança o nome
daquela que consideramos ser a verdadeira autora deste projecto:
Reafirmando a sua surpresa por:
- ele [Imperador] narn ther mandado falar neste casamento.
As datas e a maneira com o negócio foi conduzido corroboram esta tese. D. Leonor começa a
exercer verdadeira pressão junto de João III por volta de 1547, dois anos depois da morte da princesa Maria, quando enviuvara
pela segunda vez e vivia já na Flandres em companhia da irmã Maria e junto do
irmão Carlos. Este ter-se-á limitado a concordar com a vontade da rainha, sem
encontrar nisso qualquer inconveniente para a sua política europeia, mas sem se
empenhar pessoalmente, o que justificaria as escusas de João III e nomeadamente
a acção do seu embaixador na Flandres, Lourenço Pires Távora, que é, cinicamente,
aconselhado a:
- trata lo [o assunto do casamento] de tal modo que se va o mais suavemente que puder ser dispondo rara este fim [atrasar as negociações].
Este casamento tinha como grande opositor o rei João III,
julgamos, realmente por razões de Estado; nomeadamente, e uma vez mais,
financeiras. E João III ganha um aliado inesperado nesta questão».
In Carla Alferes Pinto, A Infanta Dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma
Princesa Renascentista, Fundação Oriente, 1998, ISBN 972-9440-90-5.
Cortesia
da Fundação Oriente/JDACT