quinta-feira, 11 de julho de 2013

Duas Estratégias Divergentes na Busca das Índias. D. João II vs Colombo. José M. Garcia. «A carta de 25 de Junho de 1474 enviada por Toscanelli constituiu uma resposta às interrogações portuguesas sobre qual o melhor caminho para chegar à Índia das especiarias e sobre as ilhas que se encontrariam a Ocidente»

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A busca de ilhas perdidas e o mapa perdido de Toscanelli
«(…) Esse documento foi-lhe confirmado no ano seguinte a 10 de Novembro de 1475 com um importante esclarecimento relativamente ao teor da doação anterior, de que se conserva a carta original na Biblioteca Nacional de Portugal. Afonso V doara a Fernão Teles em 1474 quaisquer ilhas que ele achar ou aquele a que as ele mandar buscar novamente e escolher pêra as haver de mandar povoar, não sendo porém tais ilhas nas partes de Guiné, sendo de considerar o empenho em procurar ilhas mais para Ocidente ou Norte dos Açores manifestado por Fernão Teles ao acabar então de adquirir as ilhas açorianas mais ocidentais até então descobertas, as Flores e o Corvo. As informações que esta personalidade possuía deveriam ser semelhantes às que tanto entusiasmaram Cristóvão Colombo em 1485 e outros que em Castela ouviram Pero Vazquez de la Frontera falar da sua convicção de haver terras a Ocidente, depois de em 1452 ter viajado no Atlântico com Diogo de Teive, que descobriu nessa altura as ilhas do Corvo e das Flores, além de ter estado talvez perto dos bancos da Terra Nova.
Na carta com o aditamento de 1475 ao contrato feito em 1474 Afonso V, ou já o seu filho por ele, justificava uma precisão que aí era feita porque em a dita carta não declara senão de ilhas despovoadas e que o dito Fernão Teles per si ou per outrem mande povoar e poderia ser que em ele as assim mandando buscar seus navios ou gente achariam as Sete Cidades ou algumas outras ilhas povoadas, que ao presente não são navegadas, nem achadas, nem trautadas per meus naturais. Podendo pensar-se que tais ilhas ficariam excluídas da concessão o rei tranquilizou o fidalgo assegurando-lhe que sempre fora sua intenção de, no caso de se encontrarem tais ilhas povoadas, elas entrarem no âmbito da concessão prometida.
O teor dubitativo do texto: e poderia ser, bem como a sua colocação no condicional: de quaisquer ilhas que achar não nos permitem admitir a hipótese de que Fernão Teles tivesse descoberto entre a concessão inicial e o aditamento alguma ilha habitada interpretada como sendo a ilha das Sete Cidades. O facto mais importante a realçar na adenda de 1475 resulta de ela ter sido motivada pela necessidade de se mencionar a possibilidade de a ilha a encontrar ser a das Sete Cidades e de esta poder ser povoada, sendo ainda de notar ser neste documento que pela primeira vez é explicitamente mencionado em Portugal o nome da ilha das Sete Cidades. Será de ponderar que esta adenda tenha já em consideração, mesmo sem a referenciar, a menção feita por Toscanelli à insula Antilia uobis nota. A proximidade das datas entre a carta de Toscanelli (25 de Junho de 1474) e a primeira doação a Fernão Teles (28 de Janeiro de 1474) bem como a adenda que lhe foi feita (10 de Novembro de 1475) leva-nos a sugerir a hipótese de que possa haver uma relação entre estes dados. Fernão Teles era um fidalgo do conselho régio que por isso bem poderia estar a par da carta de Toscanelli, não tendo chegado a proceder a qualquer tentativa de exploração por causa da guerra com Castela que então se travava e porque a 1 de Abril de 1477 foi morto com uma pedrada em Alcácer do Sal.
Na adenda de 1475 é mencionada a interdição de que as ditas ilhas não sejam nos mares cercanos à Guiné, que já ao dito meu filho tenho dado, referência que não aparecera na doação de 28 de Janeiro de 1474, pois nesta data o príncipe ainda não tinha recebido aquele cargo.
A carta de 25 de Junho de 1474 enviada por Toscanelli constituiu uma resposta às interrogações portuguesas sobre qual o melhor caminho para chegar à Índia das especiarias e sobre as ilhas que se encontrariam a Ocidente, tendo-a completado e ilustrado com um mapa. Neste calculava-se que a distância entre Lisboa e Quinsay (Zhang Zhon), uma das grandes cidades da China, seria de cerca 5194,3 milhas, isto é cerca de 9000 km, quando na realidade estava a mais de 20 000 km, e a Antilia estava assinalada no caminho para a ilha de Cipango, registando-se que da ilha de Antilia, que vós conheceis, até à nobilíssima ilha de Cipango são dez espaços Sed ad insula Antilia, vobis nota, ad insulam nobilissimam Cipango sunt decem spacia, que corresponderia a 2500 milhas italianas, isto é, uns 3700 km.
O mapa de Toscanelli perdeu-se mas é possível que tenha sido copiado por Colombo para uma carta em que se indicavam ilhas a ocidente, como se pode ver nomeadamente na anotação do diário da sua primeira viagem ao referir no dia 3 de Outubro de 1492 a sua admiração por ainda não ter visto las islas que traia pintadas en su carta. Esta sua noção poderá relacionar-se com a indicação de Las Casas de que no decorrer dessa mesma viagem Colombo revelara a convicção de que habiendo navegado de la isla de Hierro por este mar Oceano setecientas y cinqunta léguas, pocas mas o menos habia de allar tierras, isto é, uns 4400 km, sendo a distância entre as Canárias e a ilha de Guanahani, onde ele chegou, de cerca de 4800 km. O mapa de Toscanelli também terá sido utilizado para a parte mais importante da carta que em 1492 serviu de base a Martin Behaim na concepção do seu globo». In José Manuel Garcia, D. João II vs Colombo, Duas Estratégias divergentes na busca das Índias, Quidnovi, 2012, Vila do Conde, ISBN 978-989-554-912-2.

Cortesia de Quidnovi/JDACT