A “Sempre-Noiva”. Política matrimonial e Diplomacia paralela
«(…) Com efeito, ao contrário do que Carlos V planeara ao
abdicar dos reinos germânicos em favor de seu irmão Fernando, este não estava disposto
a reuni-los sob a égide de Filipe, achando antes que o legítimo herdeiro era o
seu filho varão, Maximiliano. O imperador tenta negociar com as armas que tem,
ou seja, uma filha solteira e um filho viúvo. A Infanta recebe, então, uma proposta
do tio para que casasse com o seu primo o arquiduque da Áustria, Fernando,
filho segundo de Fernando da Alemanha e Ana da Hungria.
D. Leonor, contrafeita ou não, aceitou estas alterações e
enviou à corte portuguesa um mensageiro que, sob um falso pretexto, tinha por
missão saber se a Infanta concordava com o noivo proposto pelo tio. As
converses entre os Habsburgo não teriam sido totalmente secretas, pois o certo
é que Lourenço Pires Távora soube de que tratavam e escreveu duas cartas, datadas
de Dezembro de 1550, uma ao rei e
outra à Infanta, com o intuito distorcidamente genial de convencer D. Maria que
as negociações do casamento com Filipe avançavam bem, pelo que o melhor seria recusar
a proposta de Fernando da Áustria. O que a Infanta fez.
Carlos V não tem melhor sorte com a irmã. Vendo que não
conseguia a concretização dos seus intentos, volta-se para a Infanta. Agora,
sim, com empenho:
E assim foi. João III resignou-se, desculpando-se por não poder
pagar o dote por inteiro, Portugal e a sua corte receberam parabéns e mostras
de alegria pelo casamento da Infanta, que foi mesmo chamada de princesa
de Castela. Rui Gomes Silva parte de Madrid para Lisboa com a missão de
tratar dos últimos pormenores.
Inesperadamente, morre Eduardo, subindo ao trono inglês a
princesa Maria, filha única de Catarina de Aragão. João III escreve ao seu
embaixador junto de Carlos V, António Saldanha, com toda a urgência, logo a 7
de Setembro de 1553, para que
este trate rapidamente do casamento do infante Luís com Maria Tudor, agora rainha.
Mas a diplomacia inglesa não estava parada, procurando também o melhor partido
para Maria, como o demonstra a carta de Simon Bernard, embaixador do imperador
em Inglaterra, ao bispo de Arras na qual são tratadas as questões relacionadas
com os possíveis candidatos ao matrimónio com Maria Tudor.
NOTA: Já em 1550,
quando da visita da família real à Universidade de Coimbra, o lente Martim de
Azpicuelta Navarro dedicou à Infanta o Jubileo, referindo o casamento com
Filipe de Castela. Quando se decidiu fazer a2.ª edição em 1575, o autor viu-se na obrigação de dar uma explicação para a
incongruência dos factos (que frei Miguel Pacheco transcreveu na sua obra de 1675. Este é, aliás, a mais pungente
das reacções que até nós chegou do pronunciado desaire, demonstrando a dor dos
que queriam bem à Infanta e os pedidos a Deus para que não se esquecesse dela. Luísa
Sigeia, já como latina da casa da
Infanta, dedica-lhe, também, o texto do Colloquium
(1552) aludindo ao casamento próximo
da sua senhora. E não podemos deixar de referir a presença de António Moro na
corte portuguesa no ano de 1551; enviado
pela rainha Maria da Hungria para retratar o ramo peninsular da família, o retrato
de D. Maria pode ter tido uma cópia enviada a Castela para Filipe conhecer a
sua noiva O papado tinha também dado a aprovação ao enlace, emitindo uma bula
de 6 de Março de 1543, publicada
in Corpo Diplomatico Portuguez, 1862-1891.
Nela se escreve: Que
se julgava geralmente que Monseigneur o nosso Principe (Philippe II) se desposaria
com a Princeza de Portugal, e que Ruy Gomez Silva fôra a Portugal para esses efeito.
Termina falando nas vantagens dum casamento com Filipe II. Por seu lado, a
própria Maria Tudor manifesta extremo interesse em casar com Filipe II. Numa carta
datada de 8 de Setembro de 1553,
entre as mesmas personagens, Simon Bernard dá conta de que: estava agastada [M. T.] que S. A. esposasse
a Princeza Portuguesa por ser tão proxima parenta de S. A..
Nas vésperas de Rui Gomes Silva, príncipe de Eboli, assinar
o contrato nupcial, chega a Lisboa um correio de Carlos V ordenando que se
suspenda toda a negociação, caso ainda não estivesse concluída, porque o seu
filho ia casar com a mui católica Maria Tudor».
In Carla Alferes Pinto, A Infanta Dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma
Princesa Renascentista, Fundação Oriente, 1998, ISBN 972-9440-90-5.
Cortesia
da Fundação Oriente/JDACT