Vaga, no azul amplo solta,
vai uma nuvem errando.
O meu passado não volta.
Não é o que estou chorando.
O que choro é diferente.
Entra mais na alma da alma.
Mas como, no céu sem gente,
a nuvem flutua calma.
E isto lembra uma tristeza
e a lembrança é que entristece,
dou à saudade a riqueza
de emoção que a hora tece.
Mas, em verdade, o que chora
na minha amarga ansiedade
mais alto que a nuvem mora,
está para além da saudade.
Não sei o que é nem consinto
à alma que o saiba bem.
Visto da dor com que minto
dor que a minha alma tem.
Tenho tanto sentimento
que é frequente persuadir-me
de que sou sentimental,
mas reconheço, ao medir-me,
que tudo isso é pensamento,
que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
uma vida que é vivida
e outra vida que é pensada,
e a única vida que temos
é essa que é dividida
entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
e qual errada, ninguém
nos saberá explicar;
e vivemos de maneira
que a vida que a gente tem
é a que tem que pensar.
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