terça-feira, 2 de julho de 2013

O Tempo dos Filipes em Portugal e no Brasil (1580-1668). Joaquim Veríssimo Serrão. «Para acorrer aos encargos militares da Espanha, decidiu o Olivares impor novos impostos a Portugal. Mal recebida foi essa pressão fiscal. Foi grande a reacção dos povos, o que originou uma série de motins em muitas cidades e vilas»

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O Oriente Português: a perda de Ormuz e Malaca. O Brasil
«(…) A nomeação de Francisco da Gama, 4º conde da Vidigueira, para um segundo exercício no governo da Índia não foi de molde a afastar a ameaça. Em Fevereiro de 1622, uma frota inglesa, com a ajuda do rei da Pérsia, cercou a cidade, que, por falta de homens e de víveres, a 15 de Maio teve de render-se ao inimigo. Portugal via-se assim despojado da grande fortaleza que era a chave da sua presença no oceano Índico. Na área da Insulíndia verificou-se a ameaça dos Holandeses, que se coroou em 1639 com a conquista da ilha de Ceilão e, dois anos depois, com a da cidade de Malaca, por onde se fazia todo o comércio de Goa com o Extremo Oriente. Foi um rude golpe vibrado na nossa presença na Índia e que veio a acentuar a decadência do Império que tinha Goa por capital. A Espanha filipina pouco ou nada fez para socorrer o Oriente português, dada a sua vocação ultramarina nas Américas, onde o Brasil constituía a primeira e natural defesa do hemisfério.
No princípio do século XVII aumentou a cobiça das nações marítimas sobre o Brasil. Corria a fama na Europa da imensa riqueza daquele Estado, o que era motivo para disputar a soberania portuguesa e obter os benefícios do comércio da América do Sul. Em 1612, a esquadra francesa de La Ravardière atacou o Maranhão, com o apoio dos ameríndios hostis a Portugal. Na ilha de São Luís ergueram um forte que deu origem a um pequeno burgo que se tornou a capital do Brasil francês. Filipe III reagiu à ameaça e enviou várias frotas para expulsar os invasores. Graças ao ardor de Matias Albuquerque,
capitão de Pernambuco, em 1615 era possível vencer o inimigo no seu principal bastião. A vitória obrigou a coroa a providenciar na defesa e povoamento do Maranhão e do Pará, olhando de frente para a grandeza da Amazónia.
Mais grave foi a ameaça militar dos Estados Gerais, que pretendiam criar na zona do Nordeste um Brasil holandês. A Companhia das Índias Ocidentais pretendia obter direitos sobre o tráfico com a África Meridional e as costas da América. Com grandes frotas e gente treinada na actividade marítima e comercial, a Holanda desafiava o princípio do mare clausum, querendo forjar um império ultramarino à custa das possessões portuguesas e espanholas da América. Um ataque de surpresa, em 1624,levou à conquista de Salvador, notícia que ao chegar ao Reino causou a maior emoção. No ano seguinte, uma frota enviada de Lisboa pôde reconquistar a capital do Brasil. Mas os Flamengos não desistiram do seu ambicioso plano e decidiram tomar a capital de Pernambuco, ponto mais vulnerável para a sua fixação no Brasil.
No ano de 1630, com a ajuda de uma poderosa armada e aproveitando a presença em Lisboa do capitão Matias Albuquerque, atacaram Olinda, que não tardou a render-se. Nos anos seguintes foram conquistadas outras terras do Nordeste, ao ponto de em 1640 já dominarem as cinco capitanias ao norte do rio São Francisco. Eram as esperanças de as recuperar, como escreveu o padre António Vieira, não quase, se não de todo perdidas. A realeza filipina vivia no pavor da conquista flamenga, uma vez que já se encontrava no Brasil um grande cabo de guerra, o conde Maurício de Nassau, com o fim de mover uma luta sem quartel aos Portugueses. Era a guerra, no sentido mais completo do termo, que Nassau lançava para a conquista do grande Estado, de modo a impor-lhe o domínio político, económico e militar da Holanda. Só com a Restauração, ao longo de uma luta que durou catorze anos, seria possível expulsar os invasores e conferir de novo ao Brasil a plenitude da soberania portuguesa.

As alterações de Évora
Para acorrer aos encargos militares da Espanha, decidiu o conde-duque de Olivares impor novos impostos a Portugal. Mal recebida dos povos foi essa pressão fiscal, que por meio do subsídio voluntário atingiu, em 1628, aquantia de 200 mil cruzados para socorro do Estado da Índia. Dois anos depois, mais tributos foram lançados para preparar uma frota destinada a expulsar os Holandeses de Pernambuco. Veio, em seguida, o imposto da meia anata, ou seja, metade do produto anual ou dos proventos de uma renda ou ofício. Foi grande a reacção dos povos, o que originou uma série de motins em muitas cidades e vilas. Tal facto irritou Olivares que não quis aceitar as queixas gerais contra a pressão fiscal que Filipe IV impusera ao Reino. Desde então, o primeiro-ministro insistiu na política centralista, com o objectivo de integrar Portugal na coroa vizinha. Em 1634, foi nomeada D. Margarida, duquesa de Mântua, para governadora de Portugal, tendo como secretário de Estado um português que deixou triste fama na história: Miguel Vasconcelos, fiel servidor da coroa filipina».

In Joaquim Veríssimo Serrão, O Tempo dos Filipes em Portugal e no Brasil (1580-1668), Edições Colibri, Estudos Históricos, Lisboa, 1994, ISBN 972-8047-58-4.

Cortesia de Colibri/JDACT